RC - 32580 - Sessão: 26/06/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por JACSON FROIS DE FREITAS contra sentença do Juízo da 124ª Zona Eleitoral – Alvorada, que julgou procedente a denúncia do Ministério Público Eleitoral para reconhecer o recorrente como incurso no crime tipificado no art. 39, § 5º, II, da Lei n. 9.504/97, prática de boca de urna.

A peça acusatória oferecida Ministério Público assim descreveu os fatos (fl. 02):

No dia 07 de outubro de 2012, às 10h50min, na Avenida Salomé, n. 94, em via pública, na cidade de alvorada, o denunciado JACSON FROIS DE FREITAS distribuiu material de propaganda política a eleitores (propaganda de boca de urna), consistente em panfletos eleitorais.

Na oportunidade, o denunciado, no dia das “Eleições Municipais de 2012”, foi flagrado pelo Policial Militar Sargento Abílio, quando realizava “Boca de urna”, isto é, no momento em que distribuía “santinhos”, panfletos eleitorais, do candidato a Vereador “Vânio Presa, em frente à Escola Podalírio Inácio de Barcelos, tendo sido encaminhado ao Foro da Comarca de Alvorada/RS.

A denúncia foi recebida em 17.01.2013 (fl. 10).

Foi proposta a suspensão condicional do processo pelo período de dois anos (fl. 13), vindo o réu a descumprir uma das condições (fl. 16), motivo pelo qual foi revogado o benefício (fl. 19).

O réu não foi encontrado para oferecer alegações escritas e comparecer à audiência designada (fl. 21), expedindo-se edital de intimação (fl. 23), restando deserta sua finalidade e, com isso, declarado revel o demandado (fl. 24).

Foi promovida audiência de instrução (fls. 31-34).

Oferecidas alegações finais (fls. 35-36 e 38-39), sobreveio sentença julgando procedente a ação penal para condenar JACSON FROIS DE FREITAS à pena de seis meses de detenção, em regime inicial aberto, a qual foi convertida em prestação pecuniária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) (fls. 50-75).

Em suas razões recursais, o recorrente sustenta que não há nos autos provas consubstanciais de tal situação, o que ocorreu de verdade foi o fato dessa parte ter se envolvido em uma confusão e discussão com militantes do Partido dos Trabalhadores – PT justamente em frente a uma Escola Eleitoral. Aduz que o policial afirmou em juízo que conduziu essa parte a delegacia porque estava envolvido em uma confusão com militantes do PT, e que na dúvida acabou efetuando a prisão (…). Ao fim, postula a reforma da decisão, para que seja absolvido da conduta delitiva a ele imputada (fls. 45-46).

Por sua vez, em contrarrazões, o Ministério Público requer o desprovimento do recurso, mantendo-se a sentença de primeiro grau (fls. 48-49v.).

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 53-54).

É o breve relatório.

 

VOTO

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo, visto que interposto no prazo legal de dez dias.

Atendidos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do apelo.

2. Mérito

O presente julgamento se restringe ao exame do recurso de apelação quanto ao crime previsto no art. 39, § 5º, II, da Lei 9.504/97 – prática de boca de urna:

Art. 39, § 5º. Constituem crimes, no dia da eleição, puníveis com detenção, de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR:

(...)

II - a arregimentação de eleitor ou a propaganda de boca de urna;

(Redação dada pela Lei nº 11.300, de 2006.) (Grifei.)

Trata-se de norma penal cujo bem jurídico tutelado é o livre exercício do voto. Busca, portanto, garantir que o eleitor tenha assegurada, no dia da eleição, a liberdade para exercer em sua plenitude o direito de voto, livre, portanto, de qualquer tipo de influência constrangedora ou coercitiva.

É crime formal e sua consumação não requer a ocorrência do resultado ilícito pretendido, qual seja: a efetiva influência na vontade do eleitor, maculando-a, de modo a que ele vote no candidato indicado pelo autor do delito. Assim, basta que o agente cometa qualquer conduta de aliciamento do eleitor, seja mediante a entrega direta do material de propaganda eleitoral – cujo exemplo mais comum são os santinhos –, seja por meio de aglomeração de pessoas com vestes de cores características de determinadas agremiações, seja, também, por simples conversa ao pé do ouvido do eleitor com o fito de influenciá-lo.

Traz, em seu elemento objetivo do tipo, aspecto temporal consubstanciado na oração delimitativa “no dia da eleição”. Infere-se, por conseguinte, que tal crime somente pode ser cometido na data do pleito.

Registre-se, ainda, que tal tipo penal incrimina condutas com base em conceito jurídico indeterminado – propaganda de boca de urna –, sendo de extrema importância, para que haja um juízo condenatório, que o conjunto de provas seja conclusivo, isto é, que possua força e solidez suficientes a afastar o acolhimento de qualquer tese absolutória.

Adianto que não é o caso dos presentes autos, pois, da análise do conjunto probatório, entendo que não restou comprovada a prática, pelo réu, do crime de boca de urna.

Os fatos narrados na denúncia (fl. 02) reportam-se à eventual prática de boca de urna por JACSON FROIS DE FREITAS, consistente na distribuição de panfletos aos eleitores que se dirigiam para exercer o sufrágio na Escola Podalírio Inácio de Barcelos, no Município de Alvorada.

Com o réu foram apreendidos 05 (cinco) santinhos de propaganda eleitoral em benefício do candidato a vereador Vânio Presa (auto de apreensão - fl. 08).

Na instrução foi ouvida uma única testemunha, o policial militar Alfredo Silva de Azevedo, o qual foi o responsável pela condução do réu à delegacia.

No entender da Promotoria Eleitoral (alegações finais – fl. 81), a materialidade do delito restaria comprovada pelo termo circunstanciado (fls. 05-06) e pelo auto de apreensão dos santinhos (fl. 08), ao passo que a autoria foi demonstrada pelo teor do depoimento da testemunha ouvida.

Esta foi, então, a prova produzida: apreensão de 05 (cinco) santinhos e a coleta de um testemunho, pessoa que não presenciou a entrega de material a eleitores.

Torna-se necessário reconhecer que o fato narrado não foi suficientemente comprovado nos autos, pois, para que houvesse a consumação do delito, no caso sob exame, imprescindível seria a prova de que o réu efetivamente distribuiu os santinhos. No entanto, a prova da autoria baseou-se, única e exclusivamente, no testemunho do policial Alfredo, o qual não presenciou qualquer ação nesse sentido.

A testemunha refere que lembrava “vagamente” dos acontecimentos, que havia muitas pessoas fazendo boca de urna, pertencentes ao PT e outra agremiação que não recordava, as quais entraram em discussão por acusações mútuas da prática delituosa, vindo a prender o réu, que portava cinco santinhos de um candidato à vereança. Registre-se que a confusão referida verificou-se a duas quadras do mencionado educandário.

É sabido que, em matéria penal, mesmo os fatos públicos, manifestos, de conhecimento comum, devem ser demonstrados, sobretudo quando versarem sobre a autoria ou a materialidade de determinada infração penal.

Assim, diante da ausência de prova da autoria de um fato, a notoriedade deste não a supre, devendo ser demonstrada por outros meios de prova legalmente admitidos em direito.

Portanto, o testemunho do policial não foi esclarecedor no sentido de deixar extreme de dúvidas o cometimento de ação voltada a influenciar a vontade do eleitor, mas, isso sim, que houve uma grande confusão envolvendo militantes de diferentes siglas partidárias, da qual sobreveio a prisão do réu. E somente isso.

Desse modo, o depoimento constitui prova frágil, somente alcançando relevância para a acusação se viesse reforçada, corroborada com outros elementos probatórios aptos a ensejar o decreto condenatório.

Assim, concluo que as provas trazidas não confortam um juízo de certeza sobre os fatos, pois são apenas indícios que não se revestem de força suficientemente capaz de conduzir a um juízo de condenação, pelo que se impõe o provimento do recurso a fim de que o acusado seja absolvido, na forma do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, na ausência de prova suficiente para a condenação.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso para absolver o recorrente, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal.