RE - 60157 - Sessão: 01/07/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ADOLAR RODRIGUES QUEIROZ, candidato ao cargo de prefeito no Município de Santo Ângelo, contra sentença do Juízo da 45ª Zona Eleitoral, que julgou desaprovadas as contas referentes às eleições municipais de 2012.

A desaprovação ocorreu em virtude dos seguintes apontamentos feitos pelo juízo a quo: a) divergência entre o valor do recibo eleitoral n. 0001288536RS000002 e a correspondente nota fiscal, assim como ausência de registro da doação relativa a esse recibo nas contas da Direção Municipal do PDT; b) pagamento de despesa no valor de R$ 700,00 sem a emissão de nota fiscal; c) realização de despesas após a data das eleições no valor de R$ 21.160,00; d) divergências entre dados de fornecedores da campanha e dados constantes da base da Secretaria da Receita Federal; e) pagamento de despesas em espécie sem a devida constituição de Fundo de Caixa de acordo com os critérios definidos pela legislação; f) inobservância do limite de R$ 300,00 fixado pela Resolução TSE n. 23.376/12 para o pagamento de despesas de pequeno valor; g) divergência entre o valor de cheques emitidos e as correspondentes despesas pagas; e h) lançamento do pagamento de cheque em duplicidade (fls. 447-448).

O candidato recorreu da decisão, buscando a aprovação das contas, ou, alternativamente, a sua aprovação com ressalvas. Aduziu, em síntese, que: a) a divergência entre o recibo eleitoral n. 0001288536RS000002 e a nota fiscal correspondente foi sanada com a retificação das suas contas e das contas do Diretório Municipal do PDT; b) o pagamento da despesa de R$ 700,00 foi comprovado mediante recibo, porque o fornecedor, CTG Os Legalistas, não possuía sistema de emissão de notas fiscais; c) todas as despesas de campanha foram contraídas em período anterior ao pleito, tendo havido, apenas, o pagamento de algumas delas em 08.10.2012; d) as divergências apontadas entre os dados de fornecedores e os dados da base da Secretaria da Receita Federal não foram corrigidas, apesar das diligências realizadas, porque os prestadores de serviços (cabos eleitorais) não puderam ser identificados, sendo que os valores envolvidos não comprometem a regularidade das contas apresentadas à Justiça Eleitoral; e) o pagamento de despesas em dinheiro em montante superior ao permitido pela legislação ocorreu devido ao número expressivo de prestadores de serviços, cuja maioria recebia R$ 100,00 por semana, bem como em face da recusa desses em receber por meio de cheque ou depósito bancário; f) o pagamento de despesas individuais em espécie, que ultrapassaram o valor de R$ 300,00, deveu-se à impossibilidade de impressão de novo talonário de cheques; e g) as divergências entre os valores de cheques emitidos e as despesas pagas, bem como do lançamento dúplice de cheque, decorreu de equívoco da analista judicial designada para a apreciação das contas (fls. 453-465).

O Ministério Público Eleitoral exarou parecer pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 467-468-v.).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela desaprovação da prestação, uma vez que as irregularidades descritas comprometem a confiabilidade e consistência das contas do candidato (fls. 471-476-v.).

É o breve relatório.

 

VOTO

Admissibilidade do recurso

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no DEJERS em 23.07.2013, terça-feira (fls. 450-451), e o recurso interposto em 26.07.2013, sexta-feira (fl. 453), ou seja, dentro dos três dias previstos pelo art. 30, § 5º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 56 da Resolução TSE n. 23.376/2012.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Mérito

1. Assiste razão ao recorrente quando defende que a divergência entre o recibo eleitoral n. 0001288536RS000002, emitido no valor de R$ 1.450,00, e a nota fiscal correspondente, emitida no valor de R$ 2.750,00, restou sanada nos autos.

Ao retificar suas contas, o candidato informou que o Diretório Municipal do PDT também tinha retificado as contas prestadas à Justiça Eleitoral (fl. 424). Nessa oportunidade, explicou que o partido havia cancelado os recibos eleitorais n. 0001288536RS000002 e n. 0001288536RS000003, cada um no valor de R$ 2.750,00, e emitido outros dez recibos eleitorais com relação ao valor total, ou seja, R$ 5.500,00.

Esses novos recibos emitidos eram referentes à confecção de "santinhos" pelo partido e doados a candidatos durante as eleições, segundo os DANFE n. 000.007.716 (R$ 2.750,00, à fl. 430) e n. 000.007.677 (R$ 2.750,00, à fl. 433).

Entre os dez recibos emitidos pelo partido, o de n. 0001288536RS000002 (com idêntica numeração de um dos recibos cancelados) foi lançado em nome do recorrente, no valor R$ 1.450,00 (fl. 426), e devidamente registrado no Demonstrativo dos Recursos Arrecadados (fls. 321-322) e na Descrição de Receitas Estimadas (fls. 323-324).

Esse novo recibo eleitoral (R$ 1.450,00) corresponde à quota-parte do candidato na doação de "santinhos" feita pelo partido, sendo que a sua demonstração fiscal foi feita por meio do DANFE n. 000.007.677, no valor de R$ 2.750,00, cuja cópia já havia sido apresentada pelo candidato à fl. 243.

Essa divergência, portanto, constitui irregularidade formal que não prejudica a confiabilidade das contas, à medida que foi identificada a origem dos recursos estimados em dinheiro, os quais foram arrecadados pelo candidato de forma satisfatória.

2. Do mesmo modo, a comprovação de despesa de aluguel de salão e taxa de limpeza, no valor de R$ 700,00, paga ao CTG Os Legalistas por meio de recibo, e não de nota fiscal, como exigido pelo art. 42 da Resolução TSE n. 23.376/2012, não possui relevância a ponto de implicar a desaprovação das contas.

E isso porque a origem da despesa se encontra definida nos autos, tendo sido paga por meio do cheque n. 21 (fl. 259), com recursos que transitaram pela conta bancária de campanha (fl. 438), perfazendo valor diminuto em face do total dos gastos efetuados pelo candidato (R$ 130.086,98, segundo o Resumo Financeiro de fl. 415), corretamente demonstrados em documentos fiscais idôneos.

3. Assim, também, após analisar as contas, concluo que não subsiste a irregularidade apontada na sentença quanto à existência de despesas contraídas depois da data do pleito, no montante de R$ 21.160,00, procedimento vedado pela Resolução TSE n. 23.376/2012, em seu art. 29, caput. O que se verifica é que algumas despesas relativas à prestação de serviços de cabos eleitorais foram pagas depois da data do pleito, de acordo com o extrato de fls. 437-441, o que é admitido pela sistemática de arrecadação de recursos e quitação de despesas fixada pela referida resolução.

4. No tocante às divergências de informações cadastrais de fornecedores com relação à base de dados da Secretaria da Receita Federal, noto que, de acordo com o Relatório Final de Exame (fl. 443), elas se restringem a quatro fornecedores, número pequeno frente ao total de fornecedores de bens e serviços contratados para a campanha, que se encontram relacionados no Relatório de Despesas Efetuadas (fls. 352-409).

O mencionado relatório não apontou irregularidade quanto ao pagamento desses fornecedores, tendo sido utilizados recursos que transitaram pela conta bancária específica de campanha e emitidos os respectivos recibos eleitorais, em conformidade com a Resolução TSE n. 23.376/2012. Ademais, as despesas contraídas junto a esses fornecedores somaram R$ 540,00, valor de pequena monta se comparado ao total das despesas de campanha do candidato, isto é, R$ 130.086,98, declarado no Resumo Financeiro de fl. 415.

Dessa forma, as discrepâncias identificadas no presente caso não configuram irregularidades materiais que afetem a confiabilidade das contas, sendo oportuno ressaltar, ainda, que a exigência de registro de informações dos fornecedores em total conformidade com o banco de dados da Secretaria da Receita Federal representaria excessivo rigor formal, bem como entrave às relações negociais firmadas durante o período de campanha eleitoral.

5. O lançamento em duplicidade do cheque n. 88, emitido no valor de R$ 500,00 (fl. 427), configura equívoco de natureza contábil que, igualmente, não suscita dúvida quanto às operações financeiras feitas pelo candidato. O pagamento desse cheque constituiu doação à candidata Maria Elisa Dalla Costa, mediante a emissão de recibo eleitoral (fl. 428), com recursos que transitaram pela conta bancária de campanha (fl. 440).

6. Contudo, apesar de terem sido sanadas as inconsistências anteriormente apontadas, as contas do candidato apresentam falhas que comprometem a sua transparência e confiabilidade, em virtude do que devem ser desaprovadas.

Observo que, embora o valor do cheque n. 81 (fl. 261) corresponda ao valor total dos recibos de fls. 262-279, assim como não se verifica divergência entre o valor do cheque n. 91 (fl. 280) e os recibos de fls. 281-316, respectivamente R$ 7.000,00 e R$ 16.000,00, o candidato sacou esses valores, ou seja, o total de R$ 23.000,00, para o pagamento de despesas de campanha diretamente em espécie, sem registro de Fundo de Caixa (demonstrativo sem movimentação à fl. 419 dos autos).

Ao proceder dessa maneira, o candidato também violou o art. 30, § 2º, alínea b, da Resolução TSE n. 23.376/2012, que estabelece o limite de R$ 10.000,00 para o Fundo de Caixa aos municípios com mais de 40.000, até 100.000 eleitores, como é o caso do Município de Santo Ângelo, que possui pouco mais de 60.000 eleitores.

Além disso, como apontado no Relatório Final de Exame (fl. 443-v.), o candidato utilizou o valor sacado para o pagamento de despesas de campanha nos montantes de R$ 600,00 (fl. 379), R$ 1.000,00 (fl. 403) e 1.500,00 (fl. 408). Essas transações financeiras excederam o limite de R$ 300,00 permitido pelo art. 30, § 1º, da Resolução TSE n. 23.376/2012 e deveriam ter sido pagas por meio de cheque nominal ou transferência bancária, e não diretamente em dinheiro, razão pela qual caracterizam movimentação de recursos fora da conta bancária específica de campanha, cuja consequência é a desaprovação das contas, nos termos do art. 17, caput, da mesma resolução.

Por óbvio, a exigência de cabos eleitorais e fornecedores quanto ao pagamento em dinheiro não consubstancia motivo para eximir o candidato do cumprimento da legislação eleitoral no tocante à arrecadação e gastos de recursos em período de campanha.

Tampouco considero aplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade à hipótese dos autos, para fins de caracterizar a falha como irrelevante no conjunto das contas. Veja-se que o montante de R$ 23.000,00 sacados pelo candidato é expressivo diante do total das despesas efetivamente pagas (R$ 130.086,98), tudo de acordo com o Demonstrativo de Receitas/Despesas às fl. 349-350.

Cito, a seguir, ementas de julgados em que esta egrégia Corte adotou idêntica orientação ao apreciar contas de campanhas eleitorais:

Recurso. Prestação de contas. Prefeito e vice. Art. 30, inc. III, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2012. Desaprovação no juízo originário.Saneamento, em sede recursal, de algumas falhas apontadas no parecer técnico. Persistência, no entanto, de irregularidades de natureza insanável - recebimento de doações dos diretórios municipal e estadual do partido que não transitaram pela conta bancária e ausência de registro de fundo de caixa para pagamentos em espécie das despesas de pequeno valor. Falhas que comprometem a confiabilidade e a transparência da prestação de contas. Provimento negado.

(TRE-RS - RE: 89327 RS, Relator: DR. INGO WOLFGANG SARLET, Data de Julgamento: 15/10/2013, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 193, Data 17/10/2013, Página 3.) (Grifei.)

Recurso. Prestação de contas. Candidato a prefeito. Art. 30, §§ 1º, 2º e 3º, da Resolução TSE n. 23.376/12. Eleições 2012.Desaprovação no juízo originário. 1. A ausência de registro da reserva individual rotativa em dinheiro (Fundo de Caixa), necessária para a realização dos excepcionais gastos em espécie, contraria o disposto no § 2º do art. 30 da Resolução TSE n. 23.376/12; 2. Da mesma forma, caracteriza-se como irregularidade a realização de gastos que ultrapassam o limite de dez mil reais, previsto no art. 30, § 2º, alínea "b", da mesma resolução; 3. As operações financeiras de campanha devem ser feitas por meio de cheques nominais ou transferência bancária, excepcionados os gastos de pequeno valor - § 3º do art. 30 da Resolução TSE n. 23.376/12. O candidato descumpriu o comando legal ao efetuar o pagamento de despesas em espécie acima do limite ressalvado na norma de regência.Todas configuram irregularidades que comprometem a possibilidade de verificação segura das operações financeiras, não podendo ser consideradas meras irregularidades formais.Provimento negado.

(TRE-RS - RE: 62585 RS, Relator: DR. INGO WOLFGANG SARLET, Data de Julgamento: 12/11/2013, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 211, Data 14/11/2013, Página 6. (Grifei.)

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto, mantendo a sentença de 1º grau, no sentido de desaprovar as contas de ADOLAR RODRIGUES QUEIROZ relativas às eleições municipais de 2012, com fundamento no art. 30, inc. III, da Lei n. 9.504/97.