RE - 47406 - Sessão: 10/06/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo COMITÊ FINANCEIRO ÚNICO DO PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA – PSDB DE CONDOR - contra sentença do Juízo da 115ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas referentes às eleições municipais de 2012.

Aduz que se viu obrigado a pagar as despesas em dinheiro, pois a instituição financeira não teria fornecido talonário de cheques. A negativa teria ocorrido em razão de restrição legal relativamente ao CPF do presidente do Comitê (fls. 116-117). Argumenta, ainda, que os recursos utilizados em campanha transitaram por conta bancária específica e que os comprovantes de despesas constam do processo. Juntou documentação.

O Relatório Final de Exames (fls. 955-956) apontou inconsistências relativas a recibos eleitorais, notas fiscais e a termos de cessão sem assinatura (alguns sem CNPJ); incongruências entre os valores constantes nos termos de cessão e aqueles apresentados pelos respectivos recibos eleitorais; não batimento de dados dos doadores informados e os constantes na base da Receita Federal e inobservância dos limites legais para utilização do fundo de caixa, realizando operações via saques em espécie.

Nesta instância, foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 1.017-1.019).

É o breve relatório.

 

 

VOTO

Tempestividade

Na espécie, a questão da tempestividade da interposição do recurso poderia dar azo a certa discussão. Senão, vejamos.

O Comitê foi intimado da decisão em 18 de dezembro de 2013, quarta-feira (fl. 997), e o recurso interposto em 21 de janeiro de 2014, terça-feira (fl. 1.004).

Entre tais dias, a fluência do recesso do Poder Judiciário.

Especificamente no âmbito do TRE/RS, o normativo que regulamentou o recesso foi a Portaria P n. 281, de 18.09.2013, a qual suspendeu os prazos processuais na Justiça Eleitoral do Rio Grande do Sul no período compreendido entre 20 de dezembro de 2013, quarta-feira, e 19 de janeiro de 2014, domingo.

Houvesse a referida portaria prorrogado os prazos, seria o caso de aplicação do art. 184, § 1ª, do Código de Processo Civil, de maneira que o dies a quo do presente recurso seria o dia 20 de janeiro de 2014, segunda-feira, pois o prazo de três dias teria fluído normalmente, transposto apenas o seu respectivo termo para o primeiro dia útil subsequente – 20 de janeiro de 2014.

Daí, seria o recurso intempestivo.

Não é o caso.

Como a portaria referiu suspensão, entendo pela aplicação, por analogia, do art. 179 do mesmo CPC, como já feito pelo Superior Tribunal de Justiça (Resp n. 87.830/SP, Min. Relator Ruy Rosado de Aguiar, julgado em 14.05.1996, e AgRG no Ag n. 481.013/RS, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgado em 04.11.2004).

Daí, o dies a quo, no caso, foi 21 de janeiro de 2014, data da interposição do recurso, pois, suspenso o prazo, ele voltou a fluir em 20 de janeiro de 2014 (2° dia) e findou em 21 de janeiro de 2014 (3° dia).

Tempestiva a interposição recursal.

Mérito

No mérito, trata-se de recurso em prestação de contas do Comitê Financeiro Único do PSDB de Condor, julgadas desaprovadas pelo Juízo da 115ª Zona Eleitoral, por irregularidades na escrituração contábil de modo a não permitir o conhecimento da origem de suas receitas e a destinação das despesas

Compulsando os autos, e o Relatório Final de Exames (fls. 955-956) observa-se que remanescem irregularidades que ensejam a desaprovação das contas.

As ausências de assinaturas em recibos (fls. 795, 797, 799, 803, 810, 820, 833, 846, 891) e em termos de cessão (fls. 270, 303, 437, 458, 473, 476, 578) retiram qualquer crédito que se poderia emprestar aos documentos, fragilizando demasiadamente a confiabilidade das contas.

Além, a inobservância dos limites legais para utilização do fundo de caixa fere definitivamente qualquer argumento pelo provimento recursal.

A Resolução TSE n. 23.376/12 estabelece normas claras sobre operações financeiras de campanha:

Art. 30 São gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados ( Lei nº 9.504/97, art. 26):

[...]

§ 1º Os gastos eleitorais de natureza financeira só poderão ser efetuados por meio de cheque nominal ou transferência bancária, ressalvadas as despesas de pequeno valor previstas nos §§ 2º e 3º.

§ 2º Para o pagamento de despesas de pequeno valor, poderão o candidato, o comitê financeiro e o partido político constituir reserva individual rotativa em dinheiro (Fundo de Caixa), por todo o período da campanha eleitoral, observado o trânsito prévio desses recursos na conta bancária específica, devendo ser mantida a documentação correspondente para fins de fiscalização, e respeitados os seguintes critérios:

a) nos Municípios com até 40.000 (quarenta mil) eleitores o montante da reserva deverá ser de até R$ 5.000,00 (cinco mil reais);

b) nos Municípios com mais de 40.000 (quarenta mil) até 100.000 (cem mil) eleitores o montante da reserva deverá ser de até R$ 10.000,00 (dez mil reais);

c) nos Municípios com mais de 100.000 (cem mil) até 200.000 (duzentos mil) eleitores o montante da reserva deverá ser de até R$ 15.000,00 (quinze mil reais);

d) nos Municípios com mais de 200.000 (duzentos mil) até 500.000 (quinhentos mil) eleitores o montante da reserva deverá ser de até R$ 20.000,00 (vinte mil reais);

e) nos Municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) até 900.000 (novecentos mil) eleitores o montante da reserva deverá ser de até R$ 30.000,00 (trinta mil reais);

f) nos Municípios acima de 900.000 (novecentos mil) eleitores o montante da reserva deverá ser de até R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

§ 3º Consideram-se de pequeno valor as despesas individuais que não ultrapassem o limite de R$ 300,00 (trezentos reais).

A jurisprudência tem se posicionado conforme colaciono:

Prestação de contas. Candidato.

1. Por se tratar de prestação de contas relativas à campanha eleitoral de 2010, deve ser aplicado o § 6º do art. 30 da Lei nº 9.504/97, introduzido pela Lei nº 12.034/2009, que estabelece o cabimento de recurso especial em processo de prestação de contas.

2. A realização de saques diretamente da conta bancária para o pagamento de despesas de campanha ofende o art. 21, § 1º, da Res.-TSE nº 23.217/2010, segundo o qual: "os gastos eleitorais de natureza financeira só poderão ser efetuados por meio de cheque nominal ou transferência bancária".

Agravo regimental não provido.

(TSE - Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 245.738, Relator Min. ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 16.10.2012.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO - ELEIÇÕES 2010 -SENADOR - DESCONTO DE CHEQUE NA "BOCA DO CAIXA" - PAGAMENTO EM ESPÉCIE DE DIVERSOS GASTOS ELEITORAIS - AUSÊNCIA DE CORRELAÇÃO ENTRE AS DESPESAS DE CAMPANHA E O SAQUE REALIZADO - APRESENTAÇÃO DE EXTRATOS BANCÁRIOS SEM VALOR LEGAL - IRREGULARIDADES QUE COMPROMETEM A TRANSPARÊNCIA DAS CONTAS - DESAPROVAÇÃO.

Constitui irregularidade que compromete a transparência das contas a existência de gastos eleitorais que não foram quitados por meio de cheque nominal ou transferência bancária, mormente quando não há correlação entre o valor das despesas e o do saque realizado na "boca do caixa". A prestação de contas deve ser instruída com extratos bancários abrangendo todo o período de campanha, vedando-se a apresentação de extratos parciais ou que omitam qualquer movimentação ocorrida, sem validade legal ou sujeitos à alteração. Contas desaprovadas.”

(TRE - MT - Prestação de Contas n. 456.109, Relator JOSÉ FERREIRA LEITE, DEJE - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral, Data 20.10.2011)(Grifei.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. IRREGULARIDADES. DIVERGÊNCIA. RECIBO ELEITORAL. ARRECADAÇÃO ANTERIOR ABERTURA CONTA BANCÁRIA. MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA INDEVIDA. PAGAMENTO EM ESPÉCIE. IMPOSSIBILIDADE. REJEIÇÃO. IMPROVIMENTO.

[...]5. A movimentação bancária de qualquer natureza será feita por meio de cheque nominal ou transferência bancária (art. 10, § 4º, Res. TSE nº 22.715/08), o que visa o maior controle dos gastos do candidato, não sendo aceitável que o administrador financeiro da campanha desconte um cheque de R$ 50.000,00 e distribua esse valor, em espécie, a dez fornecedores, que deveriam ter recebido, cada um, um cheque específico, no valor de R$ 5.000,00, que transitaria normalmente pela conta bancária. 6. As irregularidades detectadas não são insignificantes, pelo contrário, maculam de forma indelével a prestação de contas sob análise, gerando sérias dúvidas sobre a contabilização dos recursos arrecadados e dos gastos realizados, o que impede o efetivo controle das contas pela Justiça Eleitoral e fere a fidedignidade das informações prestadas. 7. Recurso improvido.

(TRE - TO – RECURSO ELEITORAL n. 882, Relator JOSÉ GODINHO FILHO, DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Data 19.09.2009) (Grifei.)

Cumpre referir que o Município de Condor conta com 5.094 eleitores, enquadrando-se, assim, na faixa que permite um total de despesas pagas em espécie no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Contudo, o recorrente pagou em moeda despesas de campanha no valor de R$ 58.600,00 (cinquenta e oito mil e seiscentos reais) e realizou transferência bancária no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), totalizando R$ 66.600,00 (sessenta e seis mil e seiscentos reais), mais de treze vezes o limite permitido.

Verifica-se, portanto, que o Comitê descumpriu o determinado pelo referido art. 30, § 2°, a, por realizar gastos que ultrapassaram o limite de cinco mil reais, e também por efetuar despesas não consideradas de pequeno valor, visto que excedem o limite de trezentos reais, em afronta ao § 3º.

O argumento trazido pelo recorrente de que não lhe foi fornecido talonário de cheques pois o CPF do Presidente do Comitê, Jairo José dos Santos, encontrava-se com restrições legais, também não o exime de cumprir a legislação eleitoral no ponto. É que a falta de talonário poderia ser suprida pelo expediente da transferência bancária, igualmente previsto na resolução.

As regras estabelecidas na legislação eleitoral, especialmente no que concerne às arrecadações e gastos de campanha, buscam imprimir transparência nas contas dos candidatos e partidos. As irregularidades verificadas comprometem a possibilidade de verificação segura, pela Justiça Eleitoral, das operações financeiras, não podendo ser consideradas meras irregularidades e não autorizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para o fim de aprovar as contas.

Observo que, apesar da sentença não ter expressamente discriminado a irregularidade relativa ao fundo de caixa, o recorrente teve oportunizada manifestação sobre o assunto, vez que foi abordado no Relatório Preliminar para Expedição de Diligências (fls. 100-109) e no Relatório Final de Exames (fls. 955-956).

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a desaprovação das contas do COMITÊ FINANCEIRO ÚNICO DO PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA – PSDB DE CONDOR relativas às eleições municipais de 2012, com base no art. 30, III, da Lei n. 9.504/97.