RE - 55947 - Sessão: 03/06/2014 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ELI SILVEIRA GONÇALVES, concorrente ao cargo de vereador no Município de São Pedro das Missões, contra sentença do Juízo da 32ª Zona Eleitoral, que julgou desaprovadas as contas referentes às eleições municipais de 2012 e condenou o candidato ao pagamento de multa, tendo em vista que as mesmas apresentavam diversas irregularidades insanáveis, quais sejam: a) inconsistências entre as prestações retificadoras apresentadas; b) excedido o limite de gastos estipulado pelo partido; c) despesas em valor superior ao limite legal pagas em espécie; d) divergências entre o montante de débitos constantes dos extratos eletrônicos e as despesas declaradas no Demonstrativo de Despesas Efetuadas; e) extratos bancários não foram apresentados em sua forma definitiva (fls. 118-120).

Em suas razões recursais, o recorrente sustenta que as falhas apontadas constituem erros de menor importância, decorrentes de desconhecimento da legislação eleitoral. Aduz que agiu sem dolo ou má-fé, esclarecendo ter apenas assinado os documentos que lhe foram apresentados pelo representante do partido, razões pelas quais entende excessiva a punição aplicada pelo juízo de origem. Encerra postulando a aprovação das contas (fls. 123-124).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opina pelo conhecimento e desprovimento do recurso, visto subsistirem irregularidades que comprometem a confiabilidade e a consistência dos registros contábeis, devendo ser mantida a decisão que desaprovou as contas (fls. 128-129v.).

É o breve relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A sentença foi publicada no DEJERS em 14.08.2013, e a irresignação interposta em 19.08.2013, ou seja, dentro do tríduo legal.

No mérito, não prospera a irresignação.

A desaprovação das contas pelo juízo monocrático decorreu da identificação de inúmeras irregularidades que remanesceram mesmo após o cumprimento de diligências com o intuito de regularizá-las.

Primeiramente, a decisão ora atacada arrola entre as razões de decidir a existência de inconsistências entre as prestações retificadoras apresentadas.

Da análise dos autos, verifica-se que o candidato apresentou, além da prestação inicial, duas retificadoras (fls. 02-44, 48-76 e 80-113).

Embora o foco da análise deva recair sobre a última retificadora apresentada, não há como desconsiderar as discrepâncias verificadas quando do confronto entre as três prestações, que compromete, sobremodo, a confiabilidade das contas.

Prosseguindo, tem-se que a sentença desaprovou as contas do candidato sob o argumento de que houve a superação do limite de gastos informado quando do registro de candidatura (R$ 5.000,00), aplicando multa no valor de R$ 19.600,00 com base na primeira retificadora, nos termos do art. 3º, § 5º, da Resolução TSE n. 23.376/12 .

É expressa a Res. TSE n. 23.376/2012 ao impor a aplicação de multa, diante da incidência do artigo 3º, § 5º, da Resolução n. 23.376, verbis:

§ 5º. O gasto de recursos, além dos limites estabelecidos nos termos deste artigo, sujeita os responsáveis ao pagamento de multa no valor de 5 a 10 vezes a quantia em excesso, a qual deverá ser recolhida no prazo de 5 dias úteis, contados da intimação da decisão judicial, podendo os responsáveis responder, ainda, por abuso do poder econômico, na forma do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 ( Lei n. 9.504/97, art. 18, § 2º), sem prejuízo de outras sanções cabíveis.

Nessa questão reside um dos melhores exemplos da obstrução à análise das contas advinda das discrepâncias havidas entre as prestações que compõem os autos.

A penalidade foi imposta com base em informação constante da primeira prestação retificadora, na qual o prestador alterou o valor da receita estimada relativa à cessão de veículo próprio de R$ 1.300,00, na prestação original, para R$ 5.600,00. Porém, a informação não se repete na segunda e última retificadora, onde é informado o valor de R$ 560,00 para a cessão de uso de veículos e R$ 320,00 referente à doação recebida do partido na forma de publicidade em jornais e revistas, totalizando R$ 880,00 em arrecadação de recursos estimados.

Além disso, o recibo n. 1344489486RS000002, juntado à fl. 44, informa valor idêntico ao lançado na prestação original, qual seja, R$ 1.300,00.

Dessa forma, a aplicação ou não da multa depende de escolha entre as três contabilidades trazidas pelo candidato e, uma vez que apenas a primeira retificadora informa excesso de gastos, à luz das considerações anteriormente feitas, tenho por não cabível a imposição da penalidade pecuniária. Afasto, assim, a multa aplicada.

Quanto ao pagamento em espécie de despesas sem observação do limite legal, a Resolução TSE n. 23.376/2012 estabelece no seu art. 30 a obrigatoriedade do uso de cheques nominais ou transferência bancária para as operações financeiras da campanha, excepcionando despesas de pequeno valor, as quais poderiam ser pagas em dinheiro, conforme segue:

Art. 30. São gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados ( Lei n. 9.504/97, art. 26):

(...)

§ 1º. Os gastos eleitorais de natureza financeira só poderão ser efetuados por meio de cheque nominal ou transferência bancária, ressalvadas as despesas de pequeno valor previstas nos §§ 2º e 3º.

 § 2º Para o pagamento de despesas de pequeno valor, poderão o candidato, o comitê financeiro e o partido político constituir reserva individual rotativa em dinheiro (Fundo de Caixa), por todo o período da campanha eleitoral, observado o trânsito prévio desses recursos na conta bancária específica, devendo ser mantida a documentação correspondente para fins de fiscalização, e respeitados os seguintes critérios:

(...)

b) nos Municípios com mais de 40.000 (quarenta mil) até 100.000 (cem mil) eleitores o montante da reserva deverá ser de até R$ 10.000,00 (dez mil reais);

(...)

§ 3º Consideram-se de pequeno valor as despesas individuais que não ultrapassem o limite de R$ 300,00 (trezentos reais).

Da análise dos Relatórios de Despesas Efetuadas acostados às fls. 22-9, 62-8 e 88-95, assim como da manifestação acostada à fl. 79, constata-se que, contrariando o que estabelece o dispositivo acima transcrito, o recorrente pagou em moeda todas as despesas de campanha. Ressalta-se, por oportuno, que algumas despesas excedem o limite de R$ 300,00 (trezentos reais) fixado pela norma legal.

Nesse contexto, em que a origem e a licitude dos gastos não puderam ser satisfatoriamente aferidas, conclui-se que houve ofensa ao princípio da transparência das contas ou efetivo prejuízo à fiscalização da movimentação financeira pela Justiça Eleitoral, o que autoriza a desaprovação das contas.

Foram apontadas na sentença, ainda, divergências entre o montante de débitos constantes dos extratos eletrônicos e as despesas declaradas no Demonstrativo de Despesas Efetuadas.

De acordo com o Relatório Final de Exame (fl. 114), o extrato eletrônico revela que houve movimentação irregular de recursos durante a campanha da recorrente.

A correspondência no confronto dos extratos bancários com os relatórios juntados ao processo de prestação de contas, além da declaração de todas as despesas efetuadas, são requisitos indispensáveis à demonstração da higidez das contas.

Por fim, anoto a não apresentação, pela prestadora, dos extratos definitivos da conta bancária de campanha, circunstância que inviabiliza verificação eficaz acerca da regularidade das contas, prejudicando sua confiabilidade, e contraria o artigo 40, XI e § 8º, da Resolução TSE n. 23.376, que assim dispõe:

Art. 40. A prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deverá ser instruída com os seguintes documentos:

(...)

XI – extratos da conta bancária aberta em nome do candidato, do comitê financeiro ou do partido político, nos termos exigidos pelo inciso III do art. 2º desta resolução, demonstrando a movimentação financeira ou a sua ausência;

(...)

§ 8º Os extratos bancários deverão ser entregues em sua forma definitiva, contemplando todo o período de campanha, vedada a apresentação de extratos sem validade legal, adulterados, parciais, ou que omitam qualquer movimentação financeira.

Anoto, por oportuno, que a unidade técnica de exame baseou a análise da movimentação bancária no extrato eletrônico extraído do sistema de prestação de contas da própria Justiça Eleitoral. Essa informação, porém, não supre a ausência dos extratos definitivos exigidos pela legislação reguladora da matéria, não se mostrando confiável para indicar, de forma segura, a integral movimentação financeira e, com isso, viabilizar a análise das contas.

Assim, entendo que a inexistência de extratos bancários, em sua forma definitiva e abrangendo todo o período da campanha, constitui falha insanável que compromete a regularidade das contas e enseja a sua desaprovação, pois impede a fiscalização segura e confiável das operações realizadas na campanha eleitoral.

As regras estabelecidas na legislação eleitoral, especialmente no que concerne às arrecadações e gastos de campanha, buscam imprimir transparência às contas dos candidatos e partidos. No caso concreto, as irregularidades verificadas comprometem a possibilidade de verificação segura das operações financeiras, não autorizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para o fim de aprovar as contas, como pretende o recorrente, mas plausível para afastar a multa cominada, cujo comando legal inicia com valor cinco vezes maior daquele excedido.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso interposto, exclusivamente para afastar a aplicação da multa, mantendo a desaprovação das contas de ELI SILVEIRA GONÇALVES relativas às eleições municipais de 2012, com fundamento no art. 30, inc. III, da Lei n. 9.504/97 c/c o art. 51, inc. III, da Resolução TSE n. 23.376/2012.