RE - 46584 - Sessão: 09/06/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por LOUISE DE CARVALHO DA SILVA, candidata ao cargo de vereadora no Município de Rio Grande, contra sentença do Juízo da 37ª Zona Eleitoral que julgou não prestadas as contas referentes às eleições municipais de 2012, tendo em vista que não foram apresentadas peças obrigatórias do procedimento, o que prejudica a sua análise. Destacou a magistrada de 1º grau a existência de irregularidades, apontadas no parecer técnico, quais sejam: a) identificada despesa com combustível sem o correspondente registro de locações ou cessões de veículos, bem como da estimativa da receita e da emissão de recibo eleitoral; b) ausência de recibo eleitoral referente a recurso estimado no valor de R$ 174,41; e c) identificada discrepância em valor declarado no Demonstrativo de Doações Efetuadas – a que provavelmente se refere o valor de recolhimento de sobra financeira de campanha – e correspondente guia de depósito acostada aos autos (fl. 59-59v.).

A candidata recorreu da decisão, aduzindo que utilizou em campanha veículo de propriedade de seu pai para transportá-la aos bairros e vilas da cidade, sem qualquer contraprestação de aluguel ou similar, razão pela qual não emitiu recibo eleitoral nem registrou a respectiva cessão do automóvel. Relativamente ao recibo eleitoral da doação estimável, alega ser proveniente da doação de panfletos por parte de candidato e defende a possibilidade de juntada do documento em sede recursal. Informa ainda, que o valor divergente constante no demonstrativo e na guia de depósito bancário refere-se a sobra de campanha, e que ocorreu equívoco no lançamento do valor no demonstrativo. Requer a reforma da sentença recorrida, para o fim de aprovar as contas com ressalvas (fls. 64-76).

Nesta instância, foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo conhecimento e parcial provimento do recurso, a fim de ensejar o reconhecimento da prestação de contas e, posteriormente, a sua desaprovação, na medida em que ainda restaram dúvidas sobre a contabilização das receitas e despesas de campanha (fls. 84-86).

É o breve relatório.

 

VOTO

Tempestividade

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no DEJERS em 05.07.2013, sexta-feira (fl. 62), e o recurso interposto em 10.07.2013, quarta-feira (fl. 64), ou seja, dentro dos três dias previstos pelo artigo 30, § 5º, da Lei n. 9.504/97.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

Mérito

No mérito, trata-se de recurso em prestação de contas da candidata Louise de Carvalho da Silva, julgadas não prestadas pelo Juízo da 37ª Zona Eleitoral. Entendeu a sentença originária que não houve a apresentação das contas com a totalidade dos documentos arrolados no artigo 40 da Resolução TSE n. 23.376/2012, incidindo, dessa forma, no artigo 51, IV, alínea “a”, “b” e “c”, que assim dispõe:

Art. 51.  O Juízo Eleitoral verificará a regularidade das contas, decidindo:

[...]

IV – pela não prestação, quando:

a) não apresentados, tempestivamente, as peças e documentos de que trata o art. 40 desta resolução;

b) não reapresentadas as peças que as compõem, nos termos previstos no § 2º do art. 45 e no art. 47 desta resolução;
c) apresentadas desacompanhadas de documentos que possibilitem a análise dos recursos arrecadados e dos gastos realizados na campanha.

Contudo, compulsando os autos, não vislumbro como enquadrar as contas na hipótese de não prestação, pois, conforme se extrai das fls. 02-49, vieram acompanhadas da maioria dos documentos obrigatórios pela norma, dentre os quais podemos citar:

a) ficha de qualificação dos responsáveis pela administração de recursos do comitê financeiro;

b) demonstrativo dos recibos eleitorais;

c) demonstrativo dos recursos arrecadados;

d) demonstrativo com a descrição das receitas estimadas;

e) demonstrativo de doações efetuadas a candidatos, a comitês financeiros e a partidos políticos;

f) demonstrativo de receitas e despesas;

g) demonstrativo de despesas efetuadas;

h) demonstrativo da comercialização de bens e/ou serviços e/ou da promoção de eventos;

i) demonstrativo das despesas pagas após a eleição;

j) conciliação bancária;

k) declaração de recebimento de sobras de bens e/ou materiais permanentes;

l) resumo financeiro;

m) demonstrativo de recursos de origem não identificada;

n) descrição de despesas diversas a especificar;

o) relatório de despesas efetuadas e não pagas;

p) fundo de caixa;

q) demonstrativo de transferência entre contas; e

r) descrição das doações referentes à comercialização ou evento.

Convém ressaltar que a candidata apresentou o recibo eleitoral n. 23789.88153.RS.000004, referente à doação estimada no valor de R$ 174,41 em sede recursal. Conforme relata a recorrente, o recurso arrecadado e ensejador do recibo é oriundo da doação de panfletos por parte de outro candidato, o que, conforme observa-se nos autos, foi devidamente registrado na prestação de contas (fls. 4 e 6).

Considero que o documento acostado supre a irregularidade apontada que, no contexto, ensejou a rejeição das contas.

Cabe discutir, no caso, apenas a possibilidade de conhecimento do referido recibo nesta instância. Entendo possível, eis que há compatibilidade com o artigo 266 do Código Eleitoral e com os objetivos buscados pelo processo de prestação de contas, notadamente a transparência, a efetiva fiscalização e o controle da arrecadação e dos gastos de campanha dos candidatos. Nesse sentido o entendimento desta Corte:

Recursos. Representação por condutas vedadas. Art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2012.

Alegado excesso de gasto com publicidade institucional no primeiro semestre do ano eleitoral. Parcial procedência da ação no juízo originário, com aplicação de sanção pecuniária.

Matéria preliminar afastada. Legitimidade da coligação recorrente para a interposição da irresignação, diante de prejuízo advindo da sentença.

Possibilidade de juntada de documentos em grau de recurso, conforme o "caput" do art. 266 do Código Eleitoral. Ademais, restou assegurado o contraditório por ocasião das contrarrazões recursais.

No mérito, não restou comprovada a infringência à norma legal pelos agentes públicos representados, na condição de gestores do município. Ao contrário, foi comprovado que o valor gasto pela administração com publicidade não excedeu à média dos gastos dos últimos três anos e, tampouco ao gasto do último ano imediatamente anterior ao pleito.

Inexistência de benefício aos candidatos à reeleição.

Provimento aos recursos dos candidatos e respectiva coligação.

Provimento negado aos demais recursos.

(Recurso Eleitoral n. 43.154, Acórdão de 22.01.2013, Relatora Desa. Elaine Harzheim Macedo, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 14, Data 25.01.2013, Página 3.) (Grifei.)

Feitas essas considerações, passo à análise efetiva das contas, e entendo que as falhas apontadas não têm a faculdade de levar a um juízo de desaprovação, pois as questões suscitadas são incapazes de macular a regularidade das contas.

Relativamente ao valor registrado na prestação de contas como doação financeira à direção municipal, como bem destacou o ilustre Procurador Eleitoral, resta evidente que se refere a valor de sobra de campanha eleitoral e que foi devidamente recolhido ao órgão de direção municipal do partido (fl. 39). Ocorreu meramente um equívoco na discriminação e lançamento dos valores, o que, por si só, não compromete a veracidade e transparência das contas.

Ainda, mediante a análise da documentação apresentada, verificou-se irregularidade por ausência de cessão/locação de veículos, bem como da emissão do correspondente recibo eleitoral, porquanto havia declaração de uso de combustível, pelo que se exarou notificação, a qual não restou atendida pela candidata.

Já em grau recursal, alegou, a candidata, que não houve locação de veículo, uma vez que utilizou o automóvel de seu pai para locomover-se dentro do município durante a campanha eleitoral.

De acordo com os itens constantes no Relatório de Despesas Efetuadas (fls. 8 e 12-13), verifica-se que os gastos com combustíveis foram identificados com a nominação do fornecedor, numerário, forma e data de pagamento, os quais transitaram pela conta bancária da prestadora, oportunizando a apreciação do movimento realizado, salvaguardando a boa-fé que se presume extrair da prestação apresentada.

Note-se que a campanha para o cargo de vereador, mesmo modesta e restrita ao município, de igual modo exige do candidato o deslocamento pela geografia da região, tornando-se muitas vezes imprescindível a utilização de veículo na busca dos votos de seus pretensos eleitores.

Na direção desse argumento, deve ser mencionado que no caso sob análise a quantia alcançada aos fornecedores para o abastecimento com combustíveis e lubrificantes foi de R$ 60,00 (fl. 14), mostrando-se adequada, ou até mesmo irrisória, frente ao montante arrecadado na campanha, que totalizou R$ 1.248,18. Há que se considerar, inclusive, a boa-fé da recorrente, que juntou aos autos os documentos fiscais, comprovando os gastos realizados com combustíveis (fl. 47).

Assim, a importância registrada como despesas com combustíveis é inexpressiva para configurar a grave sanção de desaprovação das contas, em consonância com a reiterada jurisprudência desta Casa:

Recurso. Prestação de contas. Eleições 2008. Doação de panfletos para campanha sem lançamento do recibo eleitoral correspondente ou comprovação da receita arrecadada. Desaprovação.

Necessidade de registro, na prestação de contas, de doações de recursos estimáveis em dinheiro efetuadas por candidatos do mesmo partido, na forma do art. 15, IV, da Resolução TSE nº 22.715/08. Irregularidade que, apesar de caracterizar erro material, não se reveste de gravidade justificadora da reprovação integral da demonstração contábil, diante do modesto valor da falha apurada. Aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Provimento parcial.

(PC 424, Rela. Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler, julgado em 17.11.10.) (Grifei.)

Não se pode descuidar que a candidata deixou de fazer constar nas suas contas o registro da cessão ou locação de veículo e a emissão do recibo eleitoral correspondente. Porém, diante das circunstâncias acima apontadas, não se vislumbra na ação da candidata o intento de subtrair ao conhecimento da Justiça a movimentação de valores, não comprometendo a adoção dos procedimentos técnicos de fiscalização e controle.

Erros formais ou materiais que não afetem a credibilidade extraída das contas não importam em sua rejeição, conforme o § 2º-A do art. 30 da Lei 9.504/97:

§ 2º-A. Erros formais ou materiais irrelevantes no conjunto da prestação de contas, que não comprometam o seu resultado, não acarretarão a rejeição das contas.

A norma referida foi reprisada pelo art. 49 da Resolução do TSE n. 23.376/2012, normatizadora da prestação de contas relativas às eleições de 2012:

Art. 49. Erros formais e materiais corrigidos ou tidos como irrelevantes no conjunto da prestação de contas não ensejam a sua desaprovação e a aplicação de sanção.

Levando em conta, ainda, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, tenho que as contas devem ser aprovadas com ressalvas, diante da constatação de falhas que não lhes comprometem a sua regularidade.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso interposto, reformando a sentença de 1º grau, no sentido de aprovar com ressalvas as contas de LOUISE DE CARVALHO DA SILVA, relativas às eleições municipais de 2012, com fulcro no art. 30, II, da Lei n. 9.504/97.