RE - 54743 - Sessão: 09/06/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por LUIZ FILIPE VIEIRA CORREA DE OLIVEIRA, candidato ao cargo de vereador no município de Porto Alegre pelo Partido Verde - PV, contra sentença do Juízo da 158ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas referentes às eleições municipais de 2012, tendo em vista as seguintes irregularidades: a) ausência de extrato bancário em sua forma definitiva, abrangendo todo o período de campanha eleitoral; b) ausência de documentação comprobatória da receitas estimadas; c) existência de despesas com combustíveis sem o correspondente registro de cessão, locação ou doação de veículo automotor; d) ausência de comprovação da regularidade com despesas contraídas e não pagas até a data da eleição, conforme determina o § 5º do art. 29 da Res. 23.376/2012 e e) ausência de demonstração de quitação ou a assunção pelo partido político de dívida de campanha no valor de R$ 1.705,32 (fls. 37-42).

O candidato recorre da decisão, suscitando, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento do seu direito de defesa, uma vez que não foi devidamente intimado para se manifestar sobre o relatório de diligências e relatório final de análise das contas. No mérito, diz que as falhas apontadas são de natureza formal e material e que não prejudicam o conjunto das contas apresentadas. Alega que as falhas foram desprovidas de má-fé e que, sendo de valor insignificante, deveria ser observado os princípios da razoabilidade e proporcionalidade para o fim de serem aprovadas as contas (fls. 48-54).

Os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo não acolhimento da preliminar suscitada e, no mérito, pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 64-68).

É o sucinto relatório.

 

VOTO

1. Admissibilidade do recurso

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no DEJERS em 04.07.2013, quinta-feira (fls. 49 e 57), e o recurso interposto em 08.07.2013, segunda-feira (fl. 48), dentro do prazo previsto pelo art. 30, § 5º, da Lei n. 9.504/97 c/c art. 56 da Resolução TSE n. 23.376/2012.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

2. Preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa

O candidato suscita a nulidade da sentença, em virtude do cerceamento do seu direito de defesa. Alega que não foi devidamente intimado a manifestar-se, tanto sobre o relatório de expedição de diligências, quanto sobre o relatório final de exame.

A preliminar, contudo, não merece ser acolhida.

Compulsando os autos, verifico que o candidato foi devidamente intimado sobre o relatório de diligências mediante mandado de intimação n. 182/2013 (fl. 27). A alegação do candidato de que o não recebimento da cópia do relatório de diligências cerceou o seu direito de defesa não procede, pois ela não é requisito do mandato de intimação. A intimação é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do processo, para que faça ou deixe de fazer alguma coisa. O candidato teve inequívoca ciência do ato, uma vez que consta sua assinatura no mandado de intimação de fl. 27.

Portanto, entendo perfectibilizado o ato de intimação.

O candidato também alega que não foi intimado a se manifestar sobre o relatório final de exame das contas.

De fato, não houve intimação do candidato sobre o relatório final.

Entretanto, o art. 48 da Res. 23.376/2012 determina que emitido relatório técnico que conclua pela existência de irregularidades e/ou impropriedades sobre as quais não se tenha dado oportunidade de manifestação ao candidato, ao partido político ou ao comitê financeiro, o Juízo Eleitoral abrirá nova vista dos autos para manifestação em 72 horas, a contar da intimação.

Destarte, segundo o citado dispositivo, só é obrigatória a intimação do relatório final quando este apontar falhas sobre as quais o candidato não tenha tido oportunidade de se manifestar, o que não é o caso dos autos, pois as falhas apontadas no relatório final das fls. 30-31 são as mesmas arroladas no relatório de diligências das fls. 28-29.

Assim, não houve cerceamento algum.

Por fim, compartilho do entendimento exposado pelo Procurador Regional Eleitoral, no sentido de que, nas razões recursais, o candidato mostrou-se inerte quanto às irregularidades apontadas no parecer técnico.

Inexiste, portanto, ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa no presente caso.

Mérito

No mérito, o candidato diz que as falhas apontadas são de natureza formal e material e que não prejudicam o conjunto das contas apresentadas, pois não há má-fé e os valores são insignificantes.

Contudo, as falhas apontadas no relatório final de exame são extremamente graves. Vejamos:

3.1. Ausência de apresentação de extrato bancário

O art. 40 da Res. 23.376/2012 aponta um rol de documentos que devem obrigatoriamente instruir a prestação de contas eleitoral. Um desses documentos é o extrato integral da conta bancária, abrangendo todo o período da campanha eleitoral, verbis:

Art. 40. A prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deverá ser instruída com os seguintes documentos:

[…]

XI – extratos da conta bancária aberta em nome do candidato, do comitê financeiro ou do partido político, nos termos exigidos pelo inciso III do art. 2º desta resolução, demonstrando a movimentação financeira ou a sua ausência;  (Grifei.)

Ainda, o § 8º do referido artigo determina que os extratos bancários deverão ser entregues em sua forma definitiva, contemplando todo o período de campanha, vedada a apresentação de extratos sem validade legal, adulterados, parciais, ou que omitam qualquer movimentação financeira.

Assim, constitui grave irregularidade a não apresentação dos extratos bancários, já que não há como proceder à análise das contas sem a sua juntada; não há como verificar a entrada e saída de recursos financeiros. Não é por acaso que o extrato da conta bancária é documento obrigatório na apresentação das contas, nos termos do art. 40, XI, da Res. 23.376/2012, já que é através dele que será analisada toda a movimentação de campanha dos candidatos, dos comitês financeiros e dos partidos políticos.

A falha é por demais grave, evidenciando que a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade conduzem, modo inequívoco, à desaprovação das contas.

Esse é o entendimento desta Corte:

Recurso. Prestação de Contas. Eleições 2008. Não apresentação de extratos bancários. Ausência de quitação de despesas e omissão de documentos fiscais referente aos recursos estimados em dinheiro.Desaprovação no juízo originário.

Falhas que comprometem a fiscalização da movimentação financeira, frustrando o escopo da normas eleitorais.

Provimento negado.

(TRE-RS, PC 553, Rel. Dr. Leonardo Tricot Saldanha, 14.03.2011.)

 

Prestação de Contas. Eleições 2010. Parecer técnico conclusivo e manifestação ministerial pela desaprovação.

Ausência dos extratos da conta bancária específica compromete a fiscalização da movimentação financeira de campanha, frustrando o escopo das normas eleitorais.

Desaprovação.

(TRE-RS, PC 7277-30.2010.6.21.0000, Rel. Des. Marco Aurélio dos Santos Caminha, 03.05.2011.)

Portanto, a ausência dos extratos bancários por si só já acarretaria a desaprovação das contas apresentadas.

3.2. Existência de despesas com combustíveis sem o correspondente registro de cessão, locação ou doação de veículo automotor e ausência de documentação comprobatória das receitas estimadas

O art. 41 da Res. 23.3.76/2013 dispõe:

Art. 41. A receita estimada, oriunda de doação/cessão ao candidato, ao comitê financeiro e ao partido político de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, deverá ser comprovada com a apresentação dos seguintes documentos:

I – documento fiscal emitido pela pessoa jurídica doadora e termo de doação por ele firmado;
II – documentos fiscais emitidos em nome do doador ou termo de doação por ele firmado, quando se tratar de doação feita por pessoa física;
III – termo de cessão, ou documento equivalente, quando se tratar de bens pertencentes ao cedente, pessoa física ou jurídica, cedidos temporariamente ao candidato, comitê financeiro ou partido político.

Verifica-se que o candidato não juntou qualquer comprovante referente às receitas estimadas em dinheiro registradas na fl. 06 dos autos.

Além disso, também houve gasto com combustíveis sem que o candidato tenha registrado nas contas algum veículo automotor. Não há nos autos termo de doação, cessão ou locação de veículo, bem como não foi registrado veículo na peça “Descrição de Receitas Estimadas”.

Assim, não restaram esclarecidas e sanadas as irregularidades apontadas no relatório final quanto a essas falhas.

3.3. Ausência de comprovação da regularidade com despesas contraídas e não pagas até a data da eleição, conforme determina o § 5º do art. 29 da Res. 23.376/2012 e ausência de demonstração de quitação ou de assunção, pelo partido político, de dívida de campanha no valor de R$ 1.705,32

O recorrente também não juntou documentos que comprovassem a regularidade das despesas contraídas e não pagas até a data do pleito (fl. 24), bem como deixou de juntar comprovante de quitação ou de assunção, pela agremiação partidária, da dívida de campanha no valor de R$ 1.705,32, desatendendo os §§ 1º, 2º e 5º do art. 29 da Res. n. 23.376/2013, que assim dispõe:

Art. 29. Os candidatos, partidos políticos e comitês financeiros poderão arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

§ 1º É permitida a arrecadação de recursos após o prazo fixado no caput exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até a data da entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral.
§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas poderão ser assumidos pelo partido político, por decisão do seu órgão nacional de direção partidária ( Lei nº 9.504/97, art. 29, § 3º).
§ 3º [ …]
§ 4º [ ...]
§ 5º As despesas já contraídas e não pagas até a data a que se refere o caput deverão ser comprovadas por documento fiscal idôneo ou por outro permitido pela legislação tributária, emitido na data da realização da despesa.

Assim, considerando que o candidato não juntou os extratos bancários, não apresentou documentação comprobatória das receitas estimadas, realizou gastos com combustíveis sem ter algum veículo automotor registrado nas contas apresentadas, não comprovou a quitação de dívida de campanha ou a sua assunção pelo partido político, deve ser mantida a sentença prolatada para o fim de serem desaprovadas as contas apresentadas.

Por fim, registro que, na aplicação dos princípios invocados no recurso, entendo que a presente decisão mostra-se proporcional e razoável ao conjunto de falhas constatadas, uma vez que, ausentes os extratos bancários, impossível analisar o total utilizado e arrecadado na campanha eleitoral.

Não é caso sequer de aprovação com ressalvas, pois os vícios aqui retratados comprometem a confiabilidade e a transparência das contas.

Ante o exposto, afasto a preliminar suscitada e VOTO pelo desprovimento do recurso interposto, mantendo a sentença que desaprovou as contas de LUIZ FILIPE VIEIRA CORREA DE OLIVEIRA, candidato ao cargo de vereador no município de Porto Alegre pelo Partido Verde, relativas às eleições municipais de 2012, com fundamento no art. 30, inc. III, da Lei nº 9.504/97 c/c o art. 51, inc. III, da Resolução TSE n. 23.376/2012.