REl - 0600270-03.2024.6.21.0143 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/04/2025 às 14:00

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso mostra-se tempestivo e preenche os demais pressupostos para que comporte seu conhecimento.

Passo, portanto, a analisar o mérito recursal.

 

MÉRITO

Conforme relatado, trata o presente feito de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), em fase recursal, ajuizada em face dos atuais prefeito e vice-prefeito do Município de Cachoeirinha/RS, em razão dos seguintes fatos narrados na exordial (ID 45752444):

“Os candidatos Cristian e João Paulo agendaram para os dias 31 de agosto e 1º de setembro a realização de evento de campanha denominado “caminhada”, em que circularão alguns pontos da região Noroeste da cidade com apoiadores da chapa.

Na manhã do dia 28 de agosto, conforme testemunho de Maristela Nizoli Moreira, residente na região, os moradores foram surpreendidos com a informação de que seria realizada uma caminhada pelo atual prefeito nas proximidades, relatando que “coincidentemente, várias máquinas e caminhões da prefeitura iniciaram imediatamente a limpeza do local” (declaração assinada em anexo).

De acordo com a moradora, o bairro apresenta, de maneira frequente, acúmulo de lixo e resíduos de todos os tipos, surpreendendo-se com o fato de a limpeza ter se iniciado após o anúncio do evento.

Igualmente, no dia seguinte, em 29 de agosto, diversos moradores relataram a movimentação de máquinas a serviço da Prefeitura de Cachoeirinha na região, em pontos das Avenidas Nossa Senhora da Boa Viagem e Beira Rio, bem como na interseção entre as Ruas Campos Salles e Doutor Nilo Peçanha (imagens e vídeos abaixo e em anexo). Nota-se, pelas imagens, a utilização de recursos significativos de equipamentos e pessoal para a realização da limpeza, com a clara finalidade de agilizar a realização do serviço.

Indagados sobre a realização da limpeza naqueles pontos específicos, funcionários a serviço da Prefeitura de Cachoeirinha informaram que foram deslocados ao local a partir de ordens diretas da empresa responsável pelo serviço de limpeza urbana, que atende os pedidos realizados pela Prefeitura da cidade.

De acordo com os agentes, solicitações como essa começaram a surgir após o início do período eleitoral, inclusive com deslocamento repentino para determinadas regiões da cidade, sem finalizar o serviço já iniciado (gravação em áudio anexo).

Nessa direção, transcreve-se alguns trechos do áudio em anexo:

“Quem pede é a empresa ou a prefeitura mesmo…tem que ligar pro marquinho pra saber quem faz o pedido…ele recebe as ordens lá da prefeitura e manda fazer a limpeza…a prefeitura pede para o marquinho os bairros que eles querem que limpar…Nós comecemo agora com os pedidos, por causa das eleição… antes a gente fazia, mas agora chegou esses pedidos por causa das eleição…eles estão pedindo mais… os dois prefeitos querem andar no limpo (risos)…

Nós estávamos lá no bosque e mandaram nois vim pra cá, lá ficou parado…o serviço lá ficou inacabado, é assim que tá funcionando, é tudo pedido…(sic)””

 

A Juíza a quo, por sua vez, ao analisar as alegações das partes e o conjunto probatório encartado nos autos, constituído pelas provas fotográficas e de áudio trazidos pelo autor, pela coleta dos depoimentos da testemunha MARISTELA NIZOLLI MOREIRA, do depoimento do então Secretário de Infraestrutura e Serviços Urbanos e do Diretor da Defesa Civil do Município de Cachoeirinha, concluiu que não restou comprovado que os serviços de limpeza prestados pela administração municipal favoreceram a campanha eleitoral de reeleição do atual prefeito. Nas palavras da Magistrada, “ocorre que não veio aos autos nenhum elemento, que não a própria caminhada em data próxima, a demonstrar tal ilegalidade. Não se pode estabelecer se a limpeza deveu-se à caminhada, se o local da caminhada foi escolhido em razão da limpeza já programada, ou se não há relação entre eles”.

Estabelecidos os limites fáticos do caso em tela, cumpre relacionar que a repressão ao abuso de poder político e econômico possui previsão constitucional insculpida no § 9º do art. 14 da Carta Magna. Vejamos:

Art. 14. […]

§ 9º. Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

 

Concretizando o comando constitucional, foi editada a Lei Complementar n. 64/90, que, visando proteger a normalidade e a legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta, estabeleceu, em seus artigos 19 e 22, que as transgressões pertinentes seriam apuradas mediante investigação judicial. Vejamos:

Art. 19. As transgressões pertinentes à origem de valores pecuniários, abuso do poder econômico ou político, em detrimento da liberdade de voto, serão apuradas mediante investigações jurisdicionais realizadas pelo Corregedor-Geral e Corregedores Regionais Eleitorais.

Parágrafo único. A apuração e a punição das transgressões mencionadas no caput deste artigo terão o objetivo de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta, indireta e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

(...)

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

(...)

XIV – julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar; (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010.) (Grifei.)

 

Categorizados como condutas de conceito aberto, os atos abusivos são conceituados como aquele ato que extrapola o exercício regular e legítimo da capacidade econômica e/ou do poder político, decorrentes da função pública exercida, capaz de causar indevido desequilíbrio, por tais condições, na igualdade entre os concorrentes ao pleito.

Destaco excerto doutrinário de lavra de CARLOS MÁRIO DA SILVA VELLOSO e WALBER DE MOURA AGRA, que melhor exemplifica a conceituação do que seria um ato abusivo na seara eleitoral:

O abuso de poder econômico e político é de difícil conceituação e mais difícil ainda sua transplantação para a realidade fática. O primeiro é a exacerbação de recursos financeiros para cooptar votos para determinado(s) candidato(s), relegando a importância da mensagem política. Há uma exacerbação de meios materiais que apresentem conteúdo econômico para o voto de forma ilícita. O segundo configura-se na utilização das prerrogativas auferidas pelo exercício de uma função pública para a obtenção de votos, esquecendo-se do tratamento isonômico a que todos os cidadãos têm direito, geralmente com o emprego de desvio de finalidade. (Elementos de Direito Eleitoral, 5ª ed., 2016, p. 422.)

 

Importante destacar que tal conduta não necessita, necessariamente, ser gravosa a ponto de alterar o resultado das urnas, caso não ocorresse. Conforme dispõe o inc. XVI do já citado art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, a quebra da normalidade do pleito, maculando-se a isonomia entre os candidatos, já é requisito suficiente para classificar determinada prática como abusiva. In verbis:

Art. 22.

(…)

XVI – para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.

 

Na mesma linha, o colendo Tribunal Superior Eleitoral, em consolidada jurisprudência, entende que, para a caracterização da abusividade, faz-se necessária a comprovação da gravidade dos fatos, e sua potencialidade para influenciar a vontade livre do eleitor e desequilibrar a disputa entre os candidatos,  devendo ser amparada em prova robusta a demonstrar tal desvirtuamento.

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1. Conforme a jurisprudência desta Corte, o ‘abuso de poder econômico configura–se por emprego desproporcional de recursos patrimoniais, públicos ou de fonte privada, vindo a comprometer valores essenciais a eleições democráticas e isentas’ (AgR–RO 8044–83, rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 5.4.2018). 2. [...]. 3. Conforme a jurisprudência desta Corte e nos termos do art. 22, XVI, da LC 64/90, para que fique configurada a prática de abuso de poder, é necessária a comprovação da gravidade dos fatos, e não sua potencialidade para alterar o resultado da eleição, isto é, deve–se levar em conta o critério qualitativo – a aptidão da conduta para influenciar a vontade livre do eleitor e desequilibrar –, e não o quantitativo, qual seja a eventual a disputa entre os candidatos diferença de votos entre o candidato eleito para determinado cargo e os não eleitos. 4. A cassação do registro ou diploma deve se basear em provas robustas, o que não se vislumbra elementos objetivamente demonstrados no decisum na espécie. Se há fundadas dúvidas acerca da gravidade da conduta, é recomendável dar prevalência à vontade popular exsurgente das urnas. Recurso especial provido. Ação cautelar julgada procedente. (Recurso Especial Eleitoral n. 114, Acórdão, Relator Min. Admar Gonzaga, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 39, Data 25.02.2019, Página 28/29).

Por seu turno, a legislação de regência concernente às condutas vedadas visa a tutelar o bem jurídico da isonomia entre os concorrentes ao pleito. Já há algum tempo, o Tribunal Superior Eleitoral tem como pacífico que as hipóteses relativas às condutas vedadas são objetivas, taxativas e de legalidade restrita, sendo que “a conduta deve corresponder ao tipo definido previamente” (Recurso Especial Eleitoral n. 24.795, Rel. Luiz Carlos Madeira, julgado em 26.10.2004).

No âmbito deste Tribunal Regional, igualmente já foi decidido que a vedação legislativa à prática das condutas vedadas tem como bem jurídico tutelado  “(…) a igualdade de oportunidades entre os concorrentes ao pleito, sendo as hipóteses relativas às condutas vedadas taxativas e de legalidade restrita” (REl n. 29933, Rel. DESA. ELAINE HARZHEIM MACEDO, j. 12.12.2012, DEJERS - Tomo 244, Data 19.12.2012).

Dessa forma, diferentemente do que ocorre nas condutas enquadráveis como abusivas, a constatação da prática de conduta vedada exige apenas a consumação do fato prescrito na legislação que o tipifica, sem necessidade de análise subjetiva ou do efeito no resultado da competição eleitoral – dizendo de outro modo, a opção legislativa na tipificação foi a de entender que a mera realização de determinadas práticas é, por si só, tendente a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos.

O recorrente aponta ilicitude pela desobediência do art. 73, incs. I e II, da Lei das Eleições e fundamenta seu recurso eleitoral em dois tópicos: (a) existência de prova sólida para abuso de poder político; (b) a relação entre a conduta praticada e o benefício político obtido. Note-se a redação do comando legal referido pelo recorrente:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;

II - usar materiais ou serviços, custeados pelos Governos ou Casas Legislativas, que excedam as prerrogativas consignadas nos regimentos e normas dos órgãos que integram;

 

Como fundamento da solidez probatória do ilícito atribuído aos recorridos, o recorrente colacionou áudio que conteria conversa entre interlocutores não identificados, entre eles, componentes da equipe executora da limpeza das vias públicas da municipalidade; com data e horários não sabidos. O áudio, juntado no ID 45752452, possui o seguinte conteúdo transcrito:

(0:00) Vou fazer a gravação aqui dos funcionários. (0:08) Oi, irmão. Tudo bem? (0:11) Como é que tá funcionando o cronograma... (0:14) Deixa eu só perguntar como é que tá funcionando o cronograma da limpeza? (0:17) Como tipo? (0:18) Vocês estão indo pra quais bairros? (0:20) Só isso aqui.

(0:22) Só? (0:22) Dentro de Cachoeirinha todo, né? (0:23) Não, sim, eu digo, mas assim, depois daqui vamos pra qual bairro? (0:26) Ah, tem que terminar aqui primeiro, aí depois vocês sabem. (0:29) É por pedido, velho. (0:30) É por pedido? (0:30) Mas quem é que pede? (0:32) Quem pede é a empresa ou a prefeitura? (0:35) Tem que ligar pro Marquinhos pra saber quem é que tá te pedindo.

(0:38) Quem é Marquinhos? (0:39) Marquinhos é o encarregado-geral lá. (0:40) Ah, ele é o encarregado-geral. (0:41) Ele é da secretaria? Ele é da empresa ou da prefeitura? (0:44) Ele recebe as ordens de lá e ele fala pra nós daqui.

(0:48) Ah, é muito barulho. (0:49) Ele recebe as ordens lá da prefeitura e aí manda vocês fazer a ligação? (0:53) Não, porque tem outros bairros aí que estão, o pessoal reclamando, (0:56) queria entender como é que é a dinâmica. (0:57) Então a prefeitura pede pro Marquinhos o bairro que eles querem que limpe (1:02) e aí vocês vêm limpar? (1:03) Isso.

(1:04) A última vez que vocês limparam aqui, vocês lembram como é que foi? (1:06) Quanto tempo é que demora pra voltar no bairro? (1:08) Ah, eu não sei. (1:10) Nós comecemos agora com os pedidos por causa das eleições. (1:14) Ah, começou agora por causa das eleições? (1:16) Antes a gente fazia, entendeu? (1:18) Só que agora começou esses pedidos por causa das eleições.

(1:20) Aí eles estão pedindo mais? (1:22) É, eles estão pedindo mais. (1:24) Como é que é? (1:25) Eles querem andar no limpo. (1:27) Tu diz aqui de cachoeirinha.

(1:28) Querem andar no limpo, claro. (1:31) E aí eles pedem por causa da eleição e a galera vem limpar. (1:33) É, tem que ver lá com eles.

(1:34) Tá. (1:37) Aqui faz... (1:37) Ei, como é irmão? Desculpa o teu nome. (1:40) Aqui faz tempo que vocês não limpavam? (1:42) Ah, eu não tenho ideia.

Eu acho que... (1:44) Não, não. Aqui, o quê? Uns seis meses. (1:48) Uns seis meses atrás limpou aqui.

(1:50) E agora depois de seis meses estão voltando. (1:51) Não limpando de novo. (1:52) Tchau, querido.

(1:58) Elas estão limpando de novo. (2:03) Demora. (2:08) Seis, seis... (2:09) Só meia dúzia? (2:16) Sim, sim.

(2:19) Tipo assim, vou só te dar um exemplo. (2:21) Nós estávamos lá no bosque. (2:24) Daí mandaram a gente vir pra cá.

(2:26) Lá ficou parado. (2:27) Vocês estavam lá no bosque? (2:29) É morar no bosque lá? (2:30) Sim. (2:32) É, lá pra estar grande.

(2:34) Daí mandaram a gente vir pra cá. (2:36) Entendeu? (2:36) Mas vocês não tinham terminado. (2:37) Não, não.

(2:38) E aí ficou lá inacabado. (2:40) Ficou inacabado. (2:41) É assim que tá funcionando.

(2:42) É tudo pedido. (2:44) Param lá e pegam lá. (2:46) Vocês estavam lá no morado, as medidas pra parar e vir pra cá.

(2:50) Daí dá pra ele não, dá pra ele... (2:52) Entendi. (2:53) Mas é assim que tá funcionando. (2:54) É? (2:54) É tudo pedido.

(2:56) Espera, volta. (2:57) Falei ali. (3:02) Ó, (inaudível)

 

Tenho que, em primeiro lugar, há que se ressaltar que nem toda prova realizada mediante gravação ambiental é considerada lícita, de plano. Ademais, para além da análise da sua licitude, cumpre sejam consideradas as circunstâncias da sua realização, ou seja, quem foi o responsável (interlocutor ou terceiro), o conhecimento ou não da gravação pelos interlocutores, o ambiente em foi realizada (público ou privado), a utilização ou não para o fim de defesa em processo criminal, a existência ou não de flagrante preparado, entre outros.

Não é possível extrair informações mínimas de quem sejam os interlocutores, nem em que tempo, lugar e circunstâncias se deu tal captação de áudio. Tampouco as alegações contidas nos diálogos captados puderam ser confirmadas posteriormente pela instrução probatória, o que não as qualifica como prova irrefutável da argumentação recursal, visto ser insuficiente para caracterizar minimamente a existência de nexo de causalidade entre a limpeza urbana e as atividades de campanha dos candidatos.

Nesse passo, bem andou a sentença prolatada pela Magistrada a quo considerar que a prova, apesar de lícita, não possui a força probatória a ela atribuída pelo ora recorrente: “a parte autora, ainda, embasou seu pedido em áudio juntado com a petição inicial, em que, apesar de narrada suposta ordem de deslocamento da equipe para fins eleitorais. Ocorre que o áudio não permite a identificação das pessoas que estão falando, nem houve prova posterior acerca da autoria das declarações. O áudio é justificativa para o recebimento da petição inicial, mas não serve como prova dos fatos alegados”.

Ainda, o recorrente alega que o registro físico do cronograma de limpeza das vias públicas pela administração do município, entregue quando do cumprimento do pedido liminar, expedido pelo Juízo a quo, pelo então Secretário de Infraestrutura de Serviços Urbanos de Cachoeirinha, EMERSON DOS SANTOS, fere os princípios da publicidade e da transparência que regem a atividade dos entes públicos, visto não existirem outros registros salvos dessa informação a fim de se averiguar a forma de elaboração e a divulgação dessa programação para a população.

O referido cronograma encontra-se juntado aos autos no ID 45752476, páginas 4 e 5.

Em contestação (ID 45752471, pp. 3 e 4), os recorridos aduzem que a referida região, que concentra as ruas onde fora realizada a alegada limpeza prévia às “caminhadas”, trata-se da localidade do município mais atingida pela histórica enchente que acometeu o Estado do Rio Grande do Sul. Nesse contexto, o acúmulo de resíduos e a necessidade de constantes limpezas das vias públicas era algo corriqueiro e esperado para o período.

Por fim, a dinâmica de entrega dos cronogramas de limpeza foi esclarecida no depoimento prestado por EMERSON DOS SANTOS, do qual a Excelentíssima Magistrada consignou: “a situação foi esclarecida pelo Secretário de infraestrutura, confirmando a narrativa da parte ré, de que a organização do serviço é realizada pessoalmente pelo fiscal, que possui o cronograma entregue pelo Secretário. Questões atinentes à falta de transparência tampouco influenciam no destino da questão eleitoral, posto que não se pode utilizá-la como presunção de cometimento do abuso do poder político”.

Mais uma vez, tenho que as alegações trazidas pela parte recorrente não possuem a robustez necessária a sustentar a alegação de abuso com intuito eleitoral ou de conduta vedada a agente público pelos recorridos, visto que a ausência de métodos mais transparentes ou organizados para comunicação da atividade estatal não é motivo suficiente para tipificar a conduta como ilícita, como pretendido pelo recorrente.

Por fim, as afirmações constantes na declaração (ID 45752453) e na oitiva de MARISTELA NIZOLI MOREIRA mostram-se consideravelmente inconsistentes. Ao tempo em que afirma que “o acúmulo de lixo e resíduos há mais de anos” nas ruas nas cercanias onde reside, não faz qualquer menção ao advento da enchente histórica como evento catalizador de acúmulo de resíduos e, consequentemente, da maior necessidade de intervenção estatal na limpeza urbana. Conforme se extrai da sentença ora impugnada, MARISTELA NIZOLI MOREIRA ainda esclareceu que as ruas onde passava a caminhada são ruas de maior movimento, situação confirmada, também, pelo Secretário EMERSON DOS SANTOS, o que denota a necessidade de maior intervenção, dado o fluxo de pessoas e veículos transitando.

De todo o conjunto probatório constituído nos autos, tenho que, na linha do opinado pela diligente Procuradoria Regional Eleitoral, não há prova que possa estabelecer um liame claro de que a limpeza das vias públicas se deu em benefício dos candidatos em campanha ou se o local da caminhada foi escolhido em razão da limpeza já programada, visto que as testemunhas informaram que, após as enchentes de 2024, as ruas atendidas eram de grande circulação e precisavam ser limpas constantemente e que a Prefeitura seguia um cronograma para realizar tal serviço que incluía outras vias além das referidas na presente ação.

Assim, sendo insuficiente o material probatório reunido, não é possível a demonstração de ocorrência de abuso de poder ou de conduta vedada, prevista no art. 73 da Lei n. 9.504/97, na linha do que vem sendo acolhido pela jurisprudência desta Justiça Eleitoral quanto ao tema: “A comprovação de conduta vedada por uso de bens públicos em benefício eleitoral exige provas objetivas e inequívocas da intenção de favorecimento eleitoral, não configuradas no presente caso" (TRE-MT - REl: 06003849020246110022 SINOP - MT 60038490, Relator.: Luis Otavio Pereira Marques, Data de Julgamento: 14.11.2024, Data de Publicação: DJE-4290, data 21.11.2024).

Portanto, não deve prosperar a irresignação, devendo permanecer hígido o juízo de improcedência da presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral.

Ante o exposto, VOTO por NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto por DAVID ALMANSA BERNARDO.