MSCiv - 0600552-82.2024.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/04/2025 às 14:00

VOTO

Trata-se de mandado de segurança impetrado por LUCIANO PINTO DA SILVA contra decisão interlocutória do Juízo da 85ª Zona Eleitoral, sediada em Torres/RS, que, nos autos da AIJE n. 0600978-33.2024.6.21.0085, após a citação do ora impetrante, “reconsiderou parcialmente decisão anterior para determinar a substituição do PSDB pela Federação PSDB Cidadania (PSDB/Cidadania) no polo ativo da ação, sob o fundamento de que a atuação da federação prevalece sobre a de partidos isolados”.

Na hipótese, a AIJE foi proposta, de modo isolado, pelo PSDB de Arroio do Sal, na data de 10.10.2024 (ID 45816223, fl. 6), ou seja, após o término do pleito municipal na circunscrição, ocorrido em 06.10.2024.

Em decisão de 16.10.2024, a Juíza Eleitoral de primeira instância determinou a citação dos investigados para a apresentação de defesa (ID 45816223, fls. 68-69).

No dia 28.10.2024, após o cumprimento dos mandados de citação, o PSDB requereu o “cadastramento” da Federação PSDB-Cidadania e da Coligação Arroio do Sal para Todos no polo ativo da demanda (ID 45816223, fl. 85), acostando as respectivas procurações à advogada subscritora da petição inicial.

Apresentada as defesas, a Magistrada reconsiderou sua decisão anterior e deferiu em parte o requerimento de modificação subjetiva da ação, ao efeito de substituir o PSDB pela Federação PSDB-Cidadania como parte autora, sob os seguintes fundamentos (ID 45816223, fls. 276-278):

[…].

De pronto, reconsidero em parte a decisão ID 125047195 para substituir o PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA de Arroio Do Sal pela FEDERAÇÃO PSDB CIDADANIA(PSDB/CIDADANIA), porém mantido o indeferimento da inclusão da Coligação ARROIO DO SAL PARA TODOS [PSD/FEDERAÇÃO PSDB CIDADANIA(PSDB/CIDADANIA)].

Não há legitimidade isolada de atuação de partido federado, caso do PSDB, já que a constituição de federação é decisão livre dos partidos envolvidos, que demanda atuação unificada após sua constituição regular, caso em tela.

ELEIÇÕES 2022 - AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL -GOVERNADOR E VICE - GOVERNADORA - ABUSO DE PODER POLÍTICO - DIRETÓRIO ESTADUAL - PARTIDO POLÍTICO QUE INTEGRA FEDERAÇÃO - ILEGITIMIDADE ATIVA - AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL - PETIÇÃO INICIAL INDEFERIDA - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - RECURSO ORDINÁRIO - NÃO-CABIMENTO - RECEBIMENTO COMO AGRAVO - POSSIBILIDADE - AUSÊNCIA DE ERRO GROSSEIRO - SUCESSÃO PROCESSUAL – IMPOSSIBILIDADE. 1. À luz do Processo Eleitoral e consideradas as dificuldades na utilização dos ritos – que mudam conforme o período em que realizados, se eleitoral ou fora dele – não há que se falar em erro grosseiro ou inescusável no manejo de recurso ordinário ao invés de agravo interno em ação cujo rito esteja previsto no art. 22 da LC n. 64/90.2. Recurso ordinário recebido como agravo interno em atenção ao princípio da fungibilidade recursal.3. Os partidos políticos que, no âmbito de sua autonomia, decidem integrar federações ou formar coligações transferem a estas a legitimidade para propor ações eleitorais (art. 11-A da Lei 9.096/95 e art. 6º, § 4º, da Lei 9.504/97).4. Não há que se falar em sucessão processual nas Ações de Investigação Judicial Eleitoral quando já ultrapassado o prazo decadencial, sob pena de burla ao marco temporal estipulado para bem da segurança jurídica ou das próprias condições para interposição das ações. 5. Conforme precedentes do Tribunal Superior Eleitoral, a sucessão processual do partido federado pela correspondente federação somente é possível nas ações eleitorais desde que o comparecimento espontâneo da Federação ocorra antes da triangulação da demanda. Desse modo, verificada na espécie a citação válida dos investigados, inclusive com apresentação de defesa, consuma-se o fenômeno da preclusão em prestígio ao princípio da estabilidade subjetiva da lide.6. Agravo conh11-Aecido e não provido. (TRE-AC. AIJE n. 0601576-74.2022.6.01.0000. Relator Desembargador LAUDIVON DE OLIVEIRA NOGUEIRA. Publicada em 24.05.2024. Trânsito em julgado em 03.06.2024)

Ainda, infrutífera a extinção do processo sem julgamento de mérito que apenas geraria nova autuação de AIJE e protelação da análise da questão cerne da demanda.

Ademais, há nos autos, inclusive, a procuração da Federação para o regular trâmite do processo: ID 125043674.

Veja-se que a autonomia do partido federado está em alguns artigos da Resolução TSE 23.670/2021, no mais prevalecendo a unicidade na atuação.

Por outro lado, não há interesse processual para a Coligação ARROIO DO SAL PARA TODOS [PSD/FEDERAÇÃO PSDB CIDADANIA(PSDB/CIDADANIA)] estar no processo, considerando a realização das Eleições Municipais de 2024, visto que após pleito a coligação não representa mais os partidos que a compõem.

Nesse sentido, colaciona-se jurisprudência:

“Eleições 2016 [...] AIJE. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei nº 9.504/1997. Assistência simples. Partido integrante da coligação. Ausência de interesse jurídico. [...] 1. O partido integrante de coligação não possui interesse jurídico para ingressar na lide na qualidade de assistente simples de candidata de outro partido. As coligações partidárias constituem pessoas jurídicas pro tempore, desfazendo-se logo que encerrado o pleito. [...].”(Ac. de 12.12.2019 no REspe nº 60952, rel. Min. Og Fernandes; no mesmo sentido o Ac. de 12.12.2019 na AC nº 060199648, rel. Min. Og Fernandes.)

[…].

 

Inconformado, o impetrante defende que, após a citação, ocorre a estabilização da lide, com a fixação definitiva dos seus elementos objetivos e subjetivos, obstando a modificação em relação às partes sem o consentimento do réu.

Com efeito, o princípio da estabilização da demanda estava previsto no art. 264 do CPC/73, conforme o qual, uma vez realizada a citação, não seriam admitidas quaisquer modificações de partes, pedidos ou causas de pedir, in verbis:

Art. 264. Feita a citação, é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu, mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei.

 

Esse princípio processual foi preservado na redação do art. 329, inc. I, do CPC/2015, mas havendo a supressão do trecho “mantendo-se as mesmas partes”:

Art. 329. O autor poderá:

I - até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu;

 

Logo, a aparente rigidez da regra insculpida na codificação revogada foi bastante flexibilizada no novo Código Processual, uma vez que se pode compreender pela possibilidade de alteração subjetiva ainda que citada a parte demandada.

Além disso, a norma em questão deve ser interpretada em conjunto com o sistema geral e com os princípios fundamentais do novo Código, que estimula os princípios da celeridade, da economia processual e da primazia do julgamento de mérito (arts. 4º e 6º do CPC).

Nessa senda, em deferência aos princípios que informam a efetividade do processo, a jurisprudência tem admitido o aditamento da inicial para modificação das partes, mesmo após a citação e sem o consentimento expresso do réu, desde que não haja alteração do pedido ou da causa de pedir.

Nesse sentido, colho julgados do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO MONITÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA AGRAVANTE.

1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, admite-se a emenda à petição inicial mesmo após a contestação quando tal diligência não ensejar a modificação do pedido ou da causa de pedir. O entendimento da Corte local está em harmonia com jurisprudência consolidada no STJ, o que atrai a incidência da Súmula 83 do STJ. Precedentes.

[…].

5. Agravo interno desprovido.

(AgInt no AREsp n. 2.394.716/GO, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 4/11/2024, DJe de 7/11/2024.) (Grifei.)

 

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ALTERAÇÃO DO PEDIDO OU DA CAUSA DE PEDIR. INCLUSÃO DE DEVEDOR SOLIDÁRIO. PRETENSÃO QUE DEMANDA REVOLVIMENTO DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULAS N. 5 E 7/STJ. DIREITO CIVIL. OUTORGA UXÓRIA. AVAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 211/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, é admissível a emenda à petição inicial para a modificação das partes, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação do réu, desde que essa emenda não gere prejuízos à sua defesa.

[…].

5. Agravo interno desprovido.

(AgInt no REsp n. 2.069.449/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 4/9/2023, DJe de 6/9/2023.) (Grifei.)

 

No caso em comento, o requerimento de alteração do polo ativo da demanda ocorreu em 28.10.2024 e foi parcialmente deferido em 18.11.2024, ou seja, em qualquer dos casos, com largo tempo anterior ao prazo final para o ajuizamento da AIJE, que se deu apenas com a diplomação dos eleitos em 18.12.2024.

Desse modo, eventual extinção da ação apenas implicaria a necessidade de reajuizamento imediato da demanda, com maiores prejuízos a todos os participantes do processo, tendo em vista a repetição de atos e o adiamento da resolução do litígio.

De igual modo, não se vislumbra na alteração do polo ativo da demanda em referência a qualquer prejuízo para os investigados, que puderam se defender de todos os fatos a eles imputados, sem modificações em relação aos pedidos, causas de pedir ou provas oferecidas.

Com essa linha de entendimento, em julgamento de AIJE originalmente ajuizada por partido político sem legitimidade ativa, este Tribunal Regional já admitiu a modificação do polo ativo em fase de alegações finais, mas ainda dentro do prazo decadencial de ajuizamento, nos termos da seguinte ementa:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2024. RECURSO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). IMPROCEDENTE. ABUSO DE PODER POLÍTICO. CONDUTA VEDADA. PARTICIPAÇÃO EM EVENTO OFICIAL. AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADE. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1.1. Recurso eleitoral contra sentença que julgou improcedente ação de investigação judicial eleitoral, entendendo ausentes práticas de abuso de poder político e de condutas vedadas.

1.2. O recorrente sustenta que a sentença desconsiderou elementos probatórios suficientes para configurar os ilícitos. Alega que o investigado participou do evento de maneira chamativa, portando a bandeira do município e ao lado do atual prefeito, no período dos três meses que antecedem o pleito eleitoral, comprometendo a isonomia da disputa eleitoral e amplificando sua visibilidade por meio da cobertura midiática e digital.

[…].

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. Ausente irregularidade no polo ativo da ação. Embora a inicial tenha sido ajuizada por partidos políticos, isoladamente, no curso da ação, dentro do prazo decadencial de ajuizamento, houve o ingresso da coligação no feito. Sanado o inicial descumprimento do disposto no art. 6º, §§ 1º e 4º, da Lei n. 9.504/97. Desnecessária e inútil a anulação da sentença para que a coligação seja intimada a integrar a ação.

[…].

(TRE-RS; RECURSO ELEITORAL nº 060033690, Acórdão, Relatora: Desa. Eleitoral Patricia Da Silveira Oliveira, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 13/02/2025) (Grifei.)

 

Portanto, não vislumbro qualquer ilegalidade na decisão impugnada a ser combatida por meio do mandado de segurança.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela denegação do mandado de segurança.