RE - 54303 - Sessão: 20/08/2014 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por DULCE BETTU ZANELLA, candidata ao cargo de vereadora no Município de Nova Alvorada, contra sentença do Juízo da 62ª Zona Eleitoral, que desaprovou as contas referentes às eleições municipais de 2012, tendo em vista as seguintes irregularidades apontadas no relatório final de exame da fl. 62: 1) recursos próprios da candidata aplicados em campanha superaram o valor do patrimônio declarado por ocasião do registro de candidatura; 2) inconsistência formal na expedição do recibo eleitoral referente à utilização de veículo de terceiro na campanha; 3) realização de despesas após a data da eleição.

A candidata recorreu da decisão, argumentando que não possui bens móveis ou imóveis e, em virtude desse motivo, nada constou na declaração de patrimônio. Alega que a receita estimada se refere à cessão de uso de veículo do seu esposo, havendo erro no preenchimento do recibo eleitoral. Aduz que a emissão e pagamento de nota fiscal, após a eleição, correspondem a despesas relativas ao período eleitoral. Postula a reforma da sentença, para o fim de aprovar as contas (fls. 75-77) e junta documentação.

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo não conhecimento do recurso, mantendo-se a sentença de desaprovação das contas (fls. 99-101).

Nesta instância, o relator, em decisão monocrática, reconheceu a tempestividade do recurso e a possibilidade de conhecimento dos documentos juntados, conforme disposição do art. 266 do Código Eleitoral. Diante da documentação ofertada, determinou o encaminhamento dos autos à Secretaria de Controle Interno deste Tribunal para análise das contas.

Após, foi emitido relatório de exame concluindo que as impropriedades identificadas não comprometem a regularidade da prestação de contas (fls. 106-109).

Foram os autos, novamente, para a Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo parcial provimento do recurso, aprovando com ressalvas as contas da candidata (fls. 111-112v.).

É o relatório.

 

VOTO

A candidata Dulce Bettu Zanella teve sua prestação de contas desaprovada em razão 1) de irregularidades por divergência entre o patrimônio declarado pela candidata, por ocasião de seu registro de candidatura, e os recursos próprios fornecidos para a campanha, 2) inconsistência formal de recibo eleitoral e, ainda, 3) realização de despesas após a data da eleição.

Os apontamentos seguem analisados separadamente.

1. O relatório final de exame da prestação de contas realizado na Zona Eleitoral (fls. 71) indicou que os recursos próprios aplicados em campanha superam em R$ 3.300,00 (três mil e trezentos reais) o valor do patrimônio declarado por ocasião do registro de candidatura.

Como bem explicitado pelo órgão técnico deste Tribunal (fls. 106-109), esse valor é composto de receita estimada (R$ 2.300,00), referente à cessão de veículo utilizado na campanha, indevidamente registrada como recursos próprios, e R$ 1.000,00, em dinheiro, proveniente da remuneração percebida pela Prefeitura Municipal de Nova Alvorada, de acordo com o comprovante de rendimentos pagos pelo órgão em relação aos exercícios de 2010, 2011 e 2012 (fls. 81-83).

Observa-se, ainda, que a candidata emitiu recibo eleitoral da doação e que os recursos transitam pela conta bancária (fl. 22), havendo, assim, a apresentação de documentos hábeis a comprovar a regularidade da doação e a procedência dos valores em espécie.

Quanto à ausência de recursos próprios na declaração de patrimônio por ocasião de seu registro de candidatura, mostra-se oportuno reproduzir parcialmente o voto do Des. Marco Aurélio Heinz, que no RE 150-89, julgado em 16.12.2013, bem analisou a questão:

Para a solução do caso, convém tecer alguns comentários sobre os recursos do próprio candidato à sua campanha.

A Res. 23.376/12, art. 18, especifica as espécies de recursos previstos para aportar os gastos de campanhas eleitorais, entre elas, no inciso I, os recursos do próprio candidato.

Art. 18. Os recursos destinados às campanhas eleitorais, respeitados os limites previstos nesta resolução, são os seguintes:

I – recursos próprios dos candidatos;

II – recursos e fundos próprios dos partidos políticos;

III – doações, em dinheiro ou estimáveis em dinheiro, de pessoas físicas ou de pessoas jurídicas;

IV – doações, por cartão de débito ou de crédito;

V – doações de outros candidatos, comitês financeiros ou partidos políticos;

VI – repasse de recursos provenientes do Fundo de Assistência Financeira aos Partidos Políticos – Fundo Partidário, de que trata o art. 38 da Lei nº 9.096/95;

VII – receita decorrente da comercialização de bens e/ou serviços e/ou da promoção de eventos, bem como da aplicação financeira dos recursos de campanha.

No cotejo dos demais incisos se depreende que esses recursos podem ser, ainda, doações estimáveis em dinheiro ou doações financeiras, estabelecendo em seu artigo 22 a operação a legitimar uma e outra doação: por via bancária, se financeira; por doação ou cessão temporária, se estimáveis em dinheiro:

Art. 22. As doações, inclusive pela internet, feitas por pessoas físicas e jurídicas em favor de candidato, comitê financeiro e/ou partido político serão realizadas mediante:

I – cheques cruzados e nominais, transferência bancária, boleto de cobrança com registro, cartão de crédito ou cartão de débito;

II – depósitos em espécie, devidamente identificados com o CPF/CNPJ do doador;

III – doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro.

As doações que caracterizam bens estimáveis em dinheiro do próprio candidato estão atingidas por uma limitação expressa no artigo 23, da Res. 23.376/12 do TSE, que considera passível de doação apenas aqueles bens integrantes do patrimônio do candidato em período anterior ao pedido de registro da candidatura, e que constaram da declaração de bens que instruiu o pedido. Reproduzo o aludido dispositivo:

Art. 23. São considerados bens estimáveis em dinheiro fornecidos pelo próprio candidato apenas aqueles integrantes do seu patrimônio em período anterior ao pedido de registro da candidatura.

Como se extrai da própria redação do artigo, somente os bens estimáveis em dinheiro devem integrar o patrimônio do candidato no período anterior a sua candidatura. A doação em espécie não é alcançada pela norma em comento, por isso nada impede que a candidata utilize recursos próprios em espécie adquiridos no decorrer da campanha ou não declarados no registro de sua candidatura.

Ademais, todos os dados constantes da declaração de bens tornam-se públicos, sendo possível a qualquer pessoa acessá-los, pois, não estão cobertos pelo sigilo – nem poderiam, uma vez que a medida tende a favorecer a transparência no exercício dos mandatos eletivos. Por outro lado, sabe-se que com os dados fiscais e bancários não é assim.

Isso posto, firmo entendimento no sentido de que os recursos próprios do candidato, quando em espécie, investidos em sua campanha, não se confundem com os bens estimáveis em dinheiro, não estando sujeito às limitações impostas pelo artigo 23.

Desse modo, resta superada a incongruência apontada.

2) Quanto à inconsistência formal na expedição do recibo eleitoral, o ponto foi mais uma vez bem analisado pela Secretaria de Controle Interno (fl. 107), verificando-se que a candidata registrou, indevidamente, a cessão do veículo utilizado como recursos próprios no Demonstrativo de Recursos Arrecadados - DRA (fl. 43), sendo que o automóvel não era de sua propriedade.

Necessário assinalar que a recorrente demonstrou boa-fé e possibilitou a efetiva fiscalização pela Justiça Eleitoral, pois apresentou o termo de cessão (fl. 20), cópia do Certificado de Registro de Licenciamento (fl. 21) e declaração de uso do veículo em campanha (fl. 31). Além disso, a falha apontada se refere a um único veículo utilizado na campanha eleitoral.

Assim, também esse apontamento mostra-se afastado.

3) Por fim, quanto à irregularidade relativa à realização de despesas após a data da eleição, recorro ao Relatório de Exame (fls. 108-109), o qual bem esclarece a situação sob exame:

A candidata registrou no Demonstrativo das Despesas Pagas Após a Eleição débito no valor de R$ 478,36, relativo à despesa com combustíveis, quitada em 08/10/12, dia seguinte ao pleito (fl. 07). A esse respeito, a candidata esclareceu que o pagamento refere-se à despesas contraídas em datas anteriores ao dia da eleição, efetuadas mediante a emissão de cupons fiscais, e pagas em 08/10/12 conforme a nota fiscal n. 515 (fl. 67).

O exame da referida nota fiscal demonstra o esclarecimento prestado pela candidata. Diante disso, considera-se cumprido o disposto no art. 29, § 5º e art. 42, da Resolução TSE n. 23.376/2012. Assim, não se identifica irregularidade no tocante ao pagamento da despesa em questão.

Também aqui a irregularidade foi superada.

Desse modo, considerando que a Resolução do TSE n. 23.376/2012 prescreve, em seu artigo 49, que erros formais e materiais corrigidos ou tidos como irrelevantes no conjunto da prestação de contas não ensejam a sua desaprovação e a aplicação de sanção, tenho que as contas devem ser aprovadas com ressalvas, pois as falhas mostram-se superáveis diante da análise sistêmica da contabilidade apresentada.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso interposto, reformando a sentença de 1º grau, no sentido de aprovar com ressalvas as contas de DULCE BETTU ZANELLA relativas às eleições municipais de 2012, com fundamento no art. 30, II, da Lei nº 9.504/97.