REl - 0600218-97.2024.6.21.0016 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/04/2025 00:00 a 04/04/2025 23:59

VOTO

Trata-se de recurso na prestação de contas apresentada por ALEXANDRE PRESTES BORTOLUZ MACIEL, candidato ao cargo de vereador no Município de Caxias do Sul pelo partido PROGRESSISTAS, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos nas Eleições Municipais de 2024.

No item 4.1 do parecer técnico (ID 45824740), foram constatadas irregularidades na comprovação dos gastos com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC em relação ao pagamento no valor de R$ 10.000,00, relativos à contratação de RAFAEL DE OLIVEIRA TEIXEIRA, infringindo o que dispõe o art. 35, §12º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Confira-se:
 

4.1. Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC
 

Com base nos procedimentos técnicos de exame e na análise documental, foram constatadas irregularidades na comprovação dos gastos com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, conforme tabela abaixo:


 

Detalhamento da inconsistência observada na tabela:

A – Não foi apresentado documento fiscal comprovando a despesa, em conformidade ao art. 53, II e de forma a comprovar os arts. 35 e 60 da Resolução TSE 23.607/2019.

B – A documentação apresentada não possui descrição detalhada da operação, sendo necessária a descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados e ou documento adicional de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço, em conformidade com art. 60 da Resolução TSE 23.607/2019.

C – A documentação de comprovação dos gastos com pessoal não apresenta a integralidade dos detalhes previstos no §12 do art. 35 da Resolução TSE 23.607/2019, tais como locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado.

C1 – Local de trabalho não especificado;

C2 – Horas trabalhadas não informadas;

C3 – Atividades executadas não especificadas;

C4 – Justificativa do preço pago não informada.

 

Com o objetivo de reverter as falhas apontadas, o candidato apresentou esclarecimentos e comprovantes nos IDs 126195785 e 126195787.

Entretanto, verificou-se que ainda restava esclarecer quanto a RAFAEL DE OLIVEIRA TEIXEIRA os detalhes dos serviços prestados que ensejaram o pagamento de R$ 10.000,00, proveniente de FEFC. Expediu-se então novo Relatório de Exame das Contas (ID 126260666), em 12.11.2024, solicitando a juntada do contrato de trabalho e de detalhamentos exigidos pelo §12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, tais como locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado.

O prestador de contas se manifestou, juntando o contrato de trabalho (ID 126274102).

O contrato juntado aos autos informa que RAFAEL DE OLIVEIRA TEIXEIRA realizaria, além de panfletagem e colocação e retirada de windbanners, serviço de motorista (cláusula 1ª). Nas cláusulas seguintes, não há descrição detalhada do serviço a ser prestado, não são informados os locais de trabalho, nem a justificativa do preço contratado, exigências do art. 35, §12º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Além disso, verificou-se que não consta na prestação de contas despesa com locação de veículo ou cessão de veículo para uso na campanha, tampouco gasto com combustível, ainda que o prestador de serviço tenha sido contratado para a função de motorista.

Em 19.11.2024, foi expedido o Relatório de Exame ID 126372315 solicitando novamente ao prestador descrição detalhada do serviço prestado, nos termos do art. 35, §2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, bem como juntada de documentos comprobatórios acerca da efetiva prestação do serviço, nos termos do art. 60, § 3º, da mesma Resolução, referente ao montante de R$ 10.000,00, recurso do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

O prestador novamente se manifestou, com a juntada da petição ID 126404792.

No documento juntado, descreve as atividades desempenhadas por RAFAEL DE OLIVEIRA TEIXEIRA, bem como locais onde foram executadas, porém, nenhum documento comprobatório da efetiva prestação do serviço foi juntado aos autos.

 Justifica a ausência de despesas financeiras ou estimáveis com veículos e combustíveis, informando que os veículos utilizados eram de propriedade do prestador, de apoiadores e do próprio candidato. Porém, nenhum comprovante referente aos veículos utilizados foi apresentado. Quanto ao veículo do próprio candidato, verificou-se que o mesmo não declarou bens no momento de seu registro de candidatura, conforme informação obtida no portal de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais6 (em anexo).

Com relação à justificativa do valor contratado, o prestador de contas apresenta levantamento de dados demonstrando a média salarial de mercado para as funções exercidas por RAFAEL. Entretanto, apresenta como valor final (R$ 12.574,28) o somatório de 510 horas trabalhadas como motorista (R$ 4.995,68), 510 horas trabalhadas como panfleteiro (R$ 3.870,90) e 510 horas trabalhadas como auxiliar geral (R$ 3.707,70). Conforme declarado na manifestação ID 126404792, item 3, durante o período de prestação de serviços, RAFAEL acumulou um total de 510 horas de trabalho, “divididas entre as atividades” (conforme manifestação ID 126404792, pg. 2), e não 510 horas trabalhadas em cada uma das funções. Ressalte-se que não foi apresentado cronograma de atividades, registro de ponto, ou qualquer outro tipo de comprovante, de modo a quantificar quantas horas desempenhou cada uma das funções elencadas.

Ante o exposto, considera-se que as manifestações jurídicas apresentadas não foram capazes de sanar as irregularidades apontadas.

Assim, por não comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, considera-se irregular o montante de R$ 10.000,00, passível de devolução ao Tesouro Nacional, conforme o art. 79, §1º da Resolução TSE n. 23.607/2019.

(grifo nosso)

 

As justificativas do recorrente, em sede de recurso, são no sentido de que: “a legislação eleitoral não impõe a obrigatoriedade de vínculo de veículos ao patrimônio da campanha nos casos em que um prestador de serviço realiza, entre outras funções, a de motorista”, bem como que “o uso de veículos de apoiadores, do próprio candidato e do prestador é prática comum e plenamente admitida, desde que observadas as restrições quanto ao custeio de combustível com recursos do FEFC”, e, ainda, que “todos os documentos e informações solicitados pela examinadora de contas foram tempestivamente apresentados, incluindo o detalhamento das atividades realizadas, os bairros atendidos e a dinâmica de execução dos serviços” não detêm o condão de afastar a irregularidade apontada.

Com efeito, extrai-se que não há comprovação da efetiva prestação do serviço pelo referido prestador, estando ausentes o cronograma de atividades, o registro de ponto ou quaisquer outros documentos comprobatórios aptos a demonstrarem a quantidade de horas desempenhadas em cada uma das funções elencadas, resultando inexistentes, ainda, qualquer comprovante referente aos veículos que supostamente teriam sido utilizados pelo candidato na campanha eleitoral cujas contas foram examinadas.

O art. 35, §12, da Resolução TSE n. 23.607/19 exige o detalhamento da contratação, com a identificação dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado, no entanto, verbis:
 

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução(Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(...)

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.


 

É importante destacar que a exigência normativa sobre o detalhamento do contrato de prestação de serviços de campanha foi uma inovação introduzida pelo Tribunal Superior Eleitoral na Resolução n. 23.607/19, para as Eleições de 2020. Em razão disso, essa prática deixou de ser considerada apenas uma falha formal e passou a ser tratada como uma irregularidade grave, especialmente quando envolve recursos públicos do FEFC.

Ademais, verifica-se, de fato, ofensa ao art. 60, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/1, como bem salientou a Procuradoria Regional Eleitoral, em sua manifestação:

 

Note-se que, em relação à comprovação dos gastos eleitorais, a Resolução TSE nº 23.607/2019 prescreve que:

Art. 60. § 3º Havendo dúvida sobre a idoneidade do documento ou sobre a execução do objeto, a Justiça Eleitoral poderá exigir a apresentação de elementos probatórios adicionais que comprovem a entrega dos produtos contratados ou a efetiva prestação dos serviços declarados. (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024) [g. n.]

Assim, porquanto não comprovada a efetiva prestação do serviço em apreço, deve ser mantido o apontamento ”
 

Acrescente-se que esse também é o posicionamento adotado pela jurisprudência deste Tribunal, conforme revela o seguinte precedente:

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. APLICAÇÃO IRREGULAR COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. GASTO COM COMBUSTÍVEL SEM O RESPECTIVO REGISTRO DO VEÍCULO. GASTO COM PESSOAL. MOTORISTA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. PERCENTUAL ELEVADO. RECOLHIMENTO DE VALOR AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidato ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022. 2. Aplicação irregular de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. 2.1. Despesa com combustível sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia. Para que a despesa com combustível possa ser considerada gasto eleitoral e, assim, ser passível de quitação com recursos de campanha, deve–se observar os requisitos específicos previstos no art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19, dentre os quais a necessidade de constar o CNPJ de campanha e estar o veículo originariamente declarado na prestação de contas. Recolhimento do valor equivalente ao Tesouro Nacional, uma vez que não comprovado o gasto eleitoral, com base no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. 2.2. Despesa com pessoal. Prestação de serviço de motorista não comprovado. O candidato não foi cessionário de veículo, seja de sua propriedade ou de terceiros, tampouco alugou automóvel, e não há referência ao serviço envolver também o fornecimento de veículo no contrato com o motorista. Ainda que o automóvel fosse cedido pelo candidato, familiares ou por terceiro, hipóteses nas quais seria dispensada a comprovação, o registro da cessão e dos respectivos valores estimados na prestação de contas é sempre obrigatório, consoante prescrevem os arts. 7º, § 10, e 60, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Gasto carente de integral comprovação, impondo o recolhimento dos valores públicos utilizados ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. 3. As irregularidades verificadas alcançam quantia que representa 27,30% do total de recursos arrecadados, revelando comprometimento suficiente a ensejar a desaprovação das contas. 4. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional (TRE-RS - PCE: XXXXX20226210000 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Data de Julgamento: 08/08/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 147, Data 14/08/2023 ) (Grifo nosso)

 

Nesse contexto, conclui-se que os apontamentos do órgão técnico revelam desacordo com os termos da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por fim, tem-se que as falhas apuradas alcançam o total de R$ 10.000,00 e representam 18,5% do montante de recursos arrecadados (R$ 54.048,00), superando, assim, os parâmetros de R$ 1.064,10 e de 10% da movimentação financeira, admitidos pela jurisprudência como “balizador, para as prestações de contas de candidatos”, e “como espécie de tarifação do princípio da insignificância” (TSE; AgR-REspe n. 0601473–67, relator: Ministro Edson Fachin, de 5.11.2019), sendo adequado, razoável e proporcional, no presente caso, o julgamento pela desaprovação das contas.

Impositiva, dessa forma, a manutenção da determinação de recolhimento do montante total de R$ 10.000,00 ao Tesouro Nacional, diante da insuficiente comprovação de regularidade no manejo de recursos do FEFC, com fulcro no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.


 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso, com a manutenção da desaprovação das contas de ALEXANDRE PRESTES BORTOLUZ, relativas ao pleito de 2024, com fulcro no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19 e determinação do recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 10.000,00.