REl - 0600924-67.2024.6.21.0085 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/04/2025 00:00 a 04/04/2025 23:59

VOTO

Luciano Pinto da Silva e Valdir Cenci, irresignados recorrem contra a sentença que desaprovou as contas de campanha referentes a suas candidaturas nas Eleições Municipais de 2024 para os cargos, respectivamente, de prefeito e vice-prefeito do Município de Arroio do Sal/RS, determinando o recolhimento de R$ 250,00 ao Tesouro Nacional, em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada relativos à emissão de nota fiscal emitida contra o CNPJ de campanha pelo fornecedor “1000 Impressões NH Ltda”, em 09.9.2024, no montante de R$ 250,00, a qual não fora declarada nas contas e cujo pagamento não transitou nas contas de campanha.

As razões recursais, em defesa, alegam que a despesa de R$ 250,00 teria sido esquecida e que o pagamento somente ocorreu após o apontamento da unidade técnica, mediante transferência bancária diretamente da conta pessoal do recorrente Luciano. Relatam que não houve excesso de autofinanciamento. Entendem que o valor representa apenas 0,2% do total de recursos arrecadados (R$ 123.970,00) e nominalmente inferior a R$ 1.064,10, comportando a aplicação dos princípios de proporcionalidade e de razoabilidade para o caso concreto.

A Procuradoria Regional Eleitoral, por sua vez, conclui que a utilização de conta bancária particular para o pagamento da despesa representa efetivamente a utilização de recursos de origem não identificada e que, em razão do percentual do dispêndio e do valor nominal do gasto, deveria ser dado parcial provimento ao recurso unicamente para aprovar as contas com ressalvas, mantido o dever de recolhimento da quantia de R$ 250,00 aos cofres públicos.

Não desconheço que recursos provenientes de contas não específicas de campanha caracterizam recursos de origem não identificada, na forma do art. 32, § 1º, inc. VI, da Lei 9.504/97:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatas ou candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

[...]

VI - os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução

Contudo, no caso em análise, trata-se de dívida de campanha não escriturada por esquecimento e paga de forma irregular diretamente pelos candidatos com recursos próprios e privados. Nesse sentido, os recorrentes afirmam que, em razão do encerramento das contas bancárias específicas de campanha, para quitar a referida dívida de R$ 250,00, realizaram a transferência bancária, na modalidade PIX, da conta bancária pessoal do recorrente Luciano para a conta bancária do fornecedor, conforme ID 45836466, p. 2.

Todavia, o pagamento de dívida de campanha, materializada na nota fiscal omitida, deveria ter sido assumida pelo partido, cumprindo o que disciplina o art. 33, §§ 2° e 3°, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, entendo que resta caracterizada a falha na contabilidade eleitoral suficiente para formar o juízo de aprovação das contas com ressalvas ou sua desaprovação.

De outro lado, na hipótese deste feito, constato a origem da verba utilizada para pagamento proveniente de conta do próprio candidato diretamente para conta bancária do fornecedor.

Aliás, sobre esse ponto, este Tribunal já se posicionou que a comprovação do pagamento de dívida com verba de conta própria do candidato viabiliza a identificação da origem do recursos e representa circunstância que afasta a necessidade de recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO ELEITO. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS. DÍVIDA DE CAMPANHA. NÃO OBSERVADA A LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA. FALHA FORMAL. PAGAMENTO REALIZADO COM VERBA ADVINDA DE CONTA PRÓPRIA DO CANDIDATO. AFASTADA A NECESSIDADE DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. BAIXO PERCENTUAL. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidato eleito ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022.

2. Após exame da contabilidade e manifestação do candidato com esclarecimentos, persistiu, além de meras impropriedades que não prejudicaram a verificação da origem das receitas, apenas a irregularidade na utilização de recursos de origem não identificada. Apresentado comprovante de pagamento.

3. Dívida de campanha declarada na prestação de contas sem apresentação da documentação regulamentar necessária para a assunção da dívida. Reconhecida falha formal por desatendimento ao art. 33, § 5º da Resolução TSE n. 23.607/19, que exige seja o recurso pago por intermédio da conta do partido. Entretanto, o pagamento da dívida foi realizado com verba advinda de conta própria do candidato, viabilizando a identificação da origem do recurso, circunstância que afasta a necessidade de recolhimento do montante ao Tesouro Nacional.

4. Na espécie, a baixíssima proporção da irregularidade, face ao total de receitas manejadas pelo candidato, torna viável a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, considerando que o valor irregular representa apenas 0,07% dos recursos recebidos.

5. Aprovação com ressalvas.

(TRE/RS, PCE n. 0602818-13.2022.6.21.0000, Relator Desembargador José Vinicius Andrade Jappur, Publicado em Sessão, 25/11/2022).

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADORA. DESAPROVAÇÃO. OMISSÃO DE DESPESA. IDENTIFICADAS NOTAS FISCAIS CONTRA O CNPJ DA CANDIDATA VIA CIRCULARIZAÇÃO. USO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA PARA PAGAMENTO. RONI.DEMONSTRADA A FONTE DA QUANTIA UTILIZADA PARA PARTE DO DISPÊNDIO. TRANSFERÊNCIA ENTRE CONTA BANCÁRIA PESSOAL E EMPRESA. PERSISTÊNCIA DE DESPESA PAGA COM RECURSOS EM ESPÉCIE SEM COMPROVAÇÃO DE ORIGEM. IRREGULARIDADE REMANESCENTE DE BAIXA MONTA.APLICAÇÃODOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de candidata, em virtude da utilização de recursos de origem não identificada - RONI para pagamento de despesas não declaradas. Não determinado o recolhimento da quantia irregular ao erário.

2. Encontradas, por meio de procedimento de circularização, notas fiscais emitidas contra o CNPJ da prestadora e não declaradas na contabilidade de campanha. Documentação acostada suficiente a comprovar parte das despesas efetuadas,visto conter demonstrativo de transferência da conta pessoal da candidata para o prestador do serviço. Persistência de dispêndio, pago em espécie, sem comprovação da origem do montante para sua quitação. Caracterizado o uso de RONI, ainda que não determinado seu recolhimento pelo juízo a quo.

3. Irregularidade remanescente de baixa monta, inferior ao parâmetro utilizado por esta Corte para considerar a quantia diminuta, de modo a autorizar, mediante aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, amitigação do juízo de desaprovação. Reforma da sentença para aprovar as contas com ressalvas.

4. Provimento parcial.

(TRE/RS, REl n. 0600661-52.2020.6.21.0060 , Relator Desembargador Eleitoral Gerson Fischmann, DJE, 15/03/2022, grifei).

 

A propósito, reproduzo as razões de decidir do Desembargador Eleitoral Gerson Fischmann no julgado acima referido:

Na hipótese em tela, a sentença entendeu que ficou comprovado o pagamento das despesas durante a campanha por meio do documento de transferência de valor entre contas do Banco Santander e do recibo emitido pela empresa Isoppo & Londero Ltda., nas sifras de R$ 433,33 e R$ 500,00, respectivamente (ID 43399483).

(…)

Contudo, entendo que, com a juntada do comprovante de transferência bancária entre contas de mesma instituição financeira, da conta pessoa física da candidata e da empresa fornecedora do serviço, na quantia de R$ 433,33, restou comprovada a origem do recurso.

Todavia, quanto à tese de que a despesa paga em espécie, de R$ 500,00, foi custeada com recursos próprios, a recorrente não trouxe aos autos documentos que demonstrassem a origem da quantia, como o extrato bancário de sua conta pessoa física.

(…)

Por essa razão, permanece somente a irregularidade referente ao recebimento de recurso de origem não identificada, devido à omissão de registro da receita utilizada para pagamento da despesa no total de R$ 500,00.”

(razões de decidir, TRE/RS, REl n. 0600661-52.2020.6.21.0060 , Relator Desembargador Eleitoral Gerson Fischmann, DJE, 15/03/2022) (Grifei).

Por conseguinte, julgo que, embora exista a irregularidade, deve ser afastada a determinação de recolhimento do valor ao Tesouro Nacional.

De outro lado, a irregularidade representa o valor de R$ 250,00 e o percentual de 0,2% do total de recursos arrecadados (R$ 123.970,00), comportando a aprovação das contas com ressalvas pela aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na hipótese em tela, considerando os critérios estabelecidos pelas Cortes Eleitorais (menor do que o valor nominal de R$ 1.064,10, inferior a 10% dos recursos arrecadados), com fundamento no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Desta forma, divirjo do parecer ministerial quanto à necessidade de recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional, devendo a sentença ser reformada para aprovar as contas com ressalvas - afastado o dever de restituição do valor de R$ 250,00 aos cofres públicos -, uma vez que é possível verificar a origem de verbas próprias do candidato recorrente.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso para aprovar as contas com ressalvas e  afastar a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.