REl - 0600173-03.2024.6.21.0046 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/03/2025 00:00 a 28/03/2025 23:59

VOTO

Primeiramente, embora não renovada em sede recursal, consigno que a preliminar de ilegitimidade de Marcelo Santos da Silva para figurar no polo passivo da presente representação, suscitada em contestação, não se sustenta.

Como bem assentado nas judiciosas razões da sentença, as publicações supostamente irregulares teriam sido veiculadas também no seu perfil pessoal e, mesmo na condição de candidato a vice-prefeito, o recorrido colheria os eventuais benefícios da publicidade inquinada.

Portanto, reconheço a legitimidade passiva do candidato a vice-prefeito para figurar como parte representada.

De igual modo, rejeito a preliminar de não conhecimento do recurso, suscitada pelos recorridos com fundamento no art. 932, inc. III, do CPC, por ofensa ao princípio da dialeticidade recursal devido à suposta ausência de enfrentamento dos fundamentos da sentença.

A irresignação desafia a conclusão de que inexistiria ofensa à legislação eleitoral na divulgação de atos de governo por meio de perfis pessoais dos pré-candidatos em momento anterior ao início do período permitido de propaganda, sendo suficiente para atacar o raciocínio da sentença, apresentando de forma coerente as razões de reforma.

Assim, conheço do recurso.

Por fim, devido ao silêncio do recorrente e à manifestação dos recorridos e da Procuradoria Regional Eleitoral pela ausência de prejuízo quanto o fato de a inicial trazer pedido de condenação por prática de abuso de poder e a ação ter sido processada pelo rito do art. 96 da Lei n. 9.504/97, em contrariedade com o disposto no art. 44 da Resolução TSE n. 23.608/19, o qual determina a observância do procedimento mais amplo previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, entendo ausente nulidade a ser declarada no feito.

No mérito, em suas razões, os recorrentes inicialmente insurgem-se contra a sentença no ponto em que não conheceu dos pedidos condenatórios em relação às publicações que versaram sobre o vídeo postado no dia 12.08 e o print do story de Instagram colacionado à fl. 6 da inicial. Afirmam a impossibilidade de referenciar o conteúdo publicado no story do Instagram, um vez que disponível temporariamente por 24 horas, e aduzem a ausência de negativa dos fatos pelos recorridos.

Em defesa, os recorridos entendem que a ausência do endereço eletrônico (URL) inviabiliza a análise judicial do conteúdo das publicações. Quanto ao vídeo do dia 12.08, informam que a veiculação foi realizada por terceiro, não havendo controle de conteúdo pelos demandados. Sobre o print, referem inexistir comprovação de seu teor.

O entendimento da magistrada a quo merece ser mantido, pois, ao tratar das provas eletrônicas, o art. 17, inc. III, da Resolução TSE n. 23.608/19 estabelece que, “no caso de manifestação em ambiente de internet, com a identificação do endereço da postagem, no âmbito e nos limites técnicos de cada serviço (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN) e a prova de que a pessoa indicada para figurar como representada ou representado é a sua autora ou o seu autor, sem prejuízo da juntada, aos autos, de arquivo contendo o áudio, a imagem e/ou o vídeo da propaganda impugnada”.

Tratando-se de conteúdo veiculado na internet, a parte autora assume o ônus de comprovar o teor da publicação mediante a informação do endereço eletrônico das postagens (URL, URI ou URN), sob pena de não conhecimento da representação.

Ademais, a tese de impossibilidade de obtenção de URL de story de Instagram não se confirma, pois para identificar a URL basta o toque no botão de mensagem ao lado do curtir e selecionar a opção “Copiar link”, o qual indica o endereço URL, conforme menciona a própria empresa em: “https://www.facebook.com/help/instagram/372819389498306”.

Além disso, a prova poderia ter sido objeto de armazenamento digital por meio de ferramenta blockchain, ou ter a veracidade atestada por ata notarial.

Portanto, acolho a judiciosa conclusão da sentença de afastar o conhecimento das “impugnações que versam sobre o vídeo postado no dia 12/08 e o print screen de story colacionado à fl. 6” da inicial.

Quanto às demais razões de reforma, a propaganda impugnada consiste em postagens nos perfis pessoais da rede social Instagram dos recorridos Rodrigo e Marcelo, candidatos à reeleição a prefeito e vice-prefeito, realizadas nos dias 25.7.2024, 31.7.2024, 05.8.2024 e 14.8.2024, contendo vídeos do recorrido Rodrigo divulgando atos da sua gestão à frente a Prefeitura Municipal de Santo Antônio da Patrulha, sem símbolos municipais, sem pedido expresso de voto, sem menção ao pleito de 2024, gravados em local aberto e acessível a qualquer candidato.

Argumenta o recorrente que as publicações, realizadas antes do período permitido, teriam violado o art. 57-A e o art. 73, inc. VI, als. “b” e “c”, ambos da Lei n. 9.504/97:

Art. 57-A. É permitida a propaganda eleitoral na internet, nos termos desta Lei, após o dia 15 de agosto do ano da eleição

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...)

VI - nos três meses que antecedem o pleito:

(...)

b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;

c) fazer pronunciamento em cadeia de rádio e televisão, fora do horário eleitoral gratuito, salvo quando, a critério da Justiça Eleitoral, tratar-se de matéria urgente, relevante e característica das funções de governo;

Contudo, entendo que a publicidade em questão deve ser interpretada de acordo com o disposto no art. 36-A da Lei n. 9.504/97:

Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet: (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico; (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária; (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos; (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

IV - a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos; (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais; (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015

(...)

§ 2o Nas hipóteses dos incs. I a VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver. (Incluído pela Lei n. 13.165, de 2015)

Do exame da propaganda, verifico tão somente a divulgação de ações políticas desenvolvidas e de atos de governo pelo então prefeito, pré-candidato à reeleição, em seu perfil pessoal, o que é permitido.

Lembro, a propósito, que esta Corte tem se posicionado no sentido de que “a divulgação de realizações do governo em perfil pessoal do agente público, voltada à exaltação de determinada candidatura, não é apta à configuração da conduta vedada em comento, consistindo em exercício legítimo da liberdade de pensamento e expressão” (TRE/RS, REl n. 060126006, Relator Desembargador Eleitoral Gerson Fischmann, publicado em sessão, 06.5.2021):

RECURSOS. ELEIÇÕES 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. AIJE. PARCIAL PROCEDÊNCIA. PRELIMINAR ACOLHIDA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. RECORRENTE NÃO CONDENADO NA SENTENÇA. CONDUTAS VEDADAS. LEI N. 9.504/97. CONCEDIDA LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIVULGAÇÃO DE CONTEÚDO EM PERFIL PARTICULAR DE REDE SOCIAL. NÃO CONFIGURADO ILÍCITO. PROVIDO RECURSO DO CANDIDATO REMANESCENTE. DESPROVIDO RECURSO INTERPOSTO PELA AGREMIAÇÃO.

1. Irresignação em face de sentença que julgou parcialmente procedente ação de investigação judicial eleitoral, condenando o candidato reeleito ao cargo de chefe do executivo municipal pela prática da conduta vedada descrita no art.73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97.

(...)

4. Inexistência de ilegalidade nas postagens realizadas pelo candidato a prefeito em seu perfil de rede social. A mais recente jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, relativa a caso análogo ao presente, em interpretação estrita do art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97, definiu que a divulgação de realizações do governo em perfil pessoal do agente público, voltada à exaltação de determinada candidatura, não é apta à configuração da conduta vedada em comento, consistindo em exercício legítimo da liberdade de pensamento e expressão (art. 5º, incs. IV e IX, da Constituição Federal), indissociáveis do debate político e da formação da vontade do eleitor em ambiente genuinamente democrático. Não caracterizada a propaganda institucional vedada aos agentes públicos pela legislação eleitoral. Improcedência da ação.

5. Provimento ao recurso do candidato remanescente. Desprovimento ao apelo do partido.

(TRE/RS, REl n. 060126006, Relator Desembargador Eleitoral Gerson Fischmann, publicado em sessão, 06.05.2021.)

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - AIJE. PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA E ABUSO DE PODER. IMPROCEDÊNCIA. PUBLICAÇÃO EM PERFIL PESSOAL. FACEBOOK. NÃO CONFIGURADA A PROPAGANDA INSTITUCIONAL. SIMPLES DIVULGAÇÃO DE ATOS E OBRAS PÚBLICAS. PROPAGANDA ELEITORAL VEICULADA EM ESPAÇO PRÓPRIO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que julgou improcedente Ação de Investigação Judicial Eleitoral - AIJE contra os candidatos à reeleição para os cargos de prefeito e vice-prefeito e o então Secretário de Obras.

2. A propaganda político-eleitoral não se confunde com a propaganda institucional. Enquanto esta exige publicações oficiais, por determinação da administração pública, em página institucional (tratando-se de internet), aquela primeira ocorre via "perfis" de usuários - candidatos ou partidos - que estão a participar da competição eleitoral. No caso, os próprios recorrentes informam, desde a peça inicial, que as publicações combatidas foram veiculadas pelas páginas pessoais dos recorridos. Ausência, portanto, de irregularidades.

3. Não se tratando de página oficial, e não havendo custeio mediante recursos públicos, não há espaço para caracterizar a propaganda combatida como publicidade institucional. Sequer se trata de propaganda eleitoral irregular. Os candidatos à reeleição utilizaram-se, em verdade, dos legítimos argumentos de continuidade de gestão, trazendo notícias de obras e realizações da administração então em curso.

4. Os fatos indicados na ação não se subsomem à norma contida no art. 73, inc. VI, al. "b", da Lei das Eleições. As publicações consubstanciam simples divulgação de atos e obras públicas desenvolvidas pelo candidato, pondo-se ao escrutínio da população para a continuidade de sua gestão, e veiculada em espaço próprio de propaganda. Descaracterizado o ilícito, não há perquirir por abuso de poder político ou econômico. Manutenção da sentença.

5. Desprovimento.

(TRE/RS, REl n. 0600401-26, Relator Desembargador Eleitoral Gustavo Alberto Gastal Diefenthäler, publicado em sessão, 11.03.2021.)

Dessa forma, a divulgação de atos de gestão em perfil pessoal não representa irregularidade eleitoral, restando afastada a eventual subsunção dos fatos ao art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97.

Ao mesmo tempo, não há notícia nos autos de qualquer transmissão em cadeia de rádio e televisão, logo não incide a regra do art. 73, inc. VI, al. “c”, da Lei n. 9.504/97 como afirmado na inicial.

Além da ausência de prova da participação no evento descrito na página 6 da inicial na impressão (print) do histórico (story) do perfil pessoal do recorrido Rodrigo, acolho o preciso apontamento da Procuradoria Regional Eleitoral de que “tendo em vista a análise das fotos acostadas à fl. 6, bem como a natureza do evento em que o atual prefeito RODRIGO GOMES MASSUOLO estava presente, é notório que a solenidade em questão não se tratava de inauguração de obra pública, consistindo apenas em evento realizado com lideranças do Governo Estadual para anunciar a assinatura de convênio para aquisição de tomógrafo ao Hospital local. Portanto, restam afastadas as sanções previstas no parágrafo único, do art. 77, da Lei n.º 9.504/97.” (ID 45729692, p. 4, caixa alta, grifo e sublinhado no original).

No caso em concreto, não se vislumbra a presença de expressão ou termo que indique qualquer inferência a equivalência semântica que remeta a pedido explícito de voto.

Por essas razões, acompanho as precisas conclusões da sentença e da Procuradoria de que “denota-se que se tratam de vídeos publicados em conta pessoal do Prefeito, que se resumem a demonstrar à população novidades quanto a obras e serviços feitos durante a gestão. Não há pedido explícito de voto, não havendo qualquer referência nesse sentido, ainda que indireta.” (ID 45720499 e ID 45764354, p. 4).

Portanto, impõe-se a manutenção da sentença.

Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso.