REl - 0600586-58.2024.6.21.0032 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/03/2025 00:00 a 28/03/2025 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto por CLOVIS BRIZOLA BUENO, candidato eleito ao cargo de vereador no Município de Palmeira das Missões/RS, nas Eleições Municipais de 2024, contra a sentença que desaprovou suas contas de campanha e determinou o recolhimento ao erário do valor de R$ 5.000,00.

Sobre o tema, a Resolução TSE n. 23.607/19, regulamentadora da matéria, assim dispõe em seu art. 21, inc. I e §§ 1º a 5º:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

(...).

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

 

Portanto, as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 somente poderão ser concretizadas por intermédio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do donatário ou cheque cruzado e nominal, e, havendo infringência a tais preceitos normativos, devem os recursos serem recolhidos ao erário, caso utilizados na campanha.

A exigência legal visa prevenir a entrada de valores de origem incerta no processo eleitoral, assegurando a transparência e a confiabilidade do financiamento de campanha por meio da rastreabilidade bancária das receitas.

A regulamentação também é aplicável na ocorrência de sucessivas movimentações de recursos em um mesmo dia, situação em que o limite indicado na norma eleitoral deve ser aferido com base no resultado da soma das operações realizadas pelo mesmo doador, como ocorreu no particular.

No caso concreto, constatou-se a realização de cinco depósitos em espécie, no valor de R$ 1.000,00 cada, totalizando R$ 5.000,00, todos realizados em 13.8.2024, com a identificação do CPF do próprio candidato.

Ocorre que está consolidado na jurisprudência o entendimento de que a mera anotação do CPF do suposto doador no depósito em espécie é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória desse ato bancário:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DOAÇÃO FINANCEIRA. DEPÓSITO EM ESPÉCIE. NÃO IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR. ART. 21, § 1º, DA RES.-TSE 23.607/2019. PERCENTUAL ELEVADO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESAPROVAÇÃO. NEGATIVA DE PROVIMENTO.1. No decisum monocrático, negou-se seguimento a recurso especial interposto contra aresto unânime em que o TRE/MA manteve a desaprovação das contas de campanha do agravante, referentes às Eleições 2020, haja vista o recebimento de doações acima de R$ 1.064,10, por meio de depósito em dinheiro, em contrariedade ao art. 21, I, § 1º, da Res.-TSE 23.607/2019, totalizando 98,54% dos recursos movimentados.2. Nos termos do art. 21, § 1º, da Res.-TSE 23.607/2019, "as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias da doadora ou do doador e da beneficiária ou do beneficiário da doação ou cheque cruzado nominal".3. A realização de depósitos identificados por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes.4. A aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar com ressalvas as contas está condicionada a três requisitos cumulativos: a) falhas que não comprometam a higidez do balanço; b) percentual ou valor inexpressivo do total irregular; c) ausência de má-fé. Precedentes.5. No caso, o depósito bancário não identificado, além de constituir falha grave, totalizou 98,54% (R$ 1.355,00) dos recursos movimentados na campanha, o que impede a aprovação do ajuste contábil.6. Agravo interno a que se nega provimento.

(TSE; Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº 060035966, Acórdão, Min. Benedito Gonçalves, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 17/10/2023) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PREFEITO E VICE-PREFEITO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. DOAÇÕES. DEPÓSITOS EM ESPÉCIE. ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DECLARAÇÃO UNILATERAL. PROVA INEFICAZ. FUNDAMENTOS SUFICIENTES NÃO ATACADOS. ENUNCIADO SUMULAR Nº 26 DO TSE. ACÓRDÃO REGIONAL EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. ENUNCIADO Nº 30 DA SÚMULA DO TSE. REJEIÇÃO DAS CONTAS. RECOLHIMENTO DOS RECURSOS AO TESOURO NACIONAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.1. Na origem, o TRE/MS manteve a sentença que desaprovou as contas de campanha do agravante em virtude do recebimento de valores de origem não identificada, mediante depósitos em espécie, e determinou o recolhimento do montante ao Tesouro Nacional.2. Não há ofensa aos arts. 275 do CE e 1.022 do CPC se as questões levantadas nos embargos foram devidamente enfrentadas pelo Tribunal de origem, embora de forma contrária ao interesse da parte embargante. Precedente.3. No recurso especial, o agravante deixou de impugnar, específica e articuladamente, todos os fundamentos suficientes do acórdão recorrido para considerar não comprovada a origem dos depósitos e não identificados os respectivos doadores - notadamente o de que sua declaração unilateral não é prova suficiente dessas circunstâncias -, o que atrai a incidência do Enunciado Sumular nº 26 desta Corte.4. Mesmo que fosse possível superar esse óbice, o acórdão recorrido está em harmonia com a jurisprudência do TSE de que a realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar a efetiva origem de doações em espécie, haja vista a ausência do prévio trânsito dos recursos pelo sistema bancário. Precedente.5. Agravo em recurso especial não provido.

(TSE; Agravo em Recurso Especial Eleitoral nº 060034745, Acórdão, Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 30/08/2022) (Grifei.)

 

Apesar de o recorrente ter afirmado, em uma nota explicativa (ID 124679528), que a movimentação financeira foi um engano relacionado à sua conta empresarial, um erro que teria ocorrido ao passar os dados bancários de sua conta de campanha para seus clientes, essa justificativa se revelou inconsistente, na medida em que os valores foram depositados diretamente pelo candidato em sua conta de campanha e não foram acostados elementos probatórios mínimos da alegação.

A irregularidade impede o rastreio da origem dos recursos e viola o disposto nos arts. 21, § 4º, e 32 da Resolução TSE n. 23.607/19, que determinam o recolhimento de valores de origem não identificada ao Tesouro Nacional.

O montante correspondente aos depósitos irregulares representa 74% do total das receitas arrecadadas pelo candidato, que somam R$ 6.752,43. Esse percentual substancial afeta significativamente a consistência das contas, distanciando-se das hipóteses em que a irregularidade, por ser irrelevante ou isolada, permite aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

Nesse contexto, esta Corte Regional considera que a mitigação de irregularidades, por meio da aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, somente se justifica quando o impacto das falhas seja limitado. Para tanto, é necessário que as inconsistências apresentem um valor nominal inferior a R$ 1.064,10, ou representem menos de 10% do total da receita arrecadada, requisitos claramente não atendidos no caso em análise.

Assim, resta inviabilizada a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade como forma de mitigar a gravidade das falhas, impondo-se a manutenção do juízo de desaprovação das contas.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.