PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS (12046) Nº 0600918-73.2020.6.21.0029 / 0029ª ZONA ELEITORAL DE LAJEADO/RS
REQUERENTE: ELEICAO 2020 VALDECIRA VANESSA DE ALMEIDA HUTT VEREADORA
Eminente Relator,
para conferir maior celeridade na tramitação das prestações de contas das eleições de 2020, os pareceres desta Procuradoria estão sendo encaminhados em formato simplificado, como segue.
Trata-se de prestação de contas da candidata a vereadora VALDECIRA VANESSA DE ALMEIDA HUTT, relativamente às eleições de 2020, no município de LAJEADO/RS.
A sentença desaprovou as contas, com base no art. 74, III, da Resolução TSE nº 23.607/2019, e determinou o recolhimento de R$ 500,00 ao Tesouro Nacional, relativos a pagamentos efetuados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) sem a devida identificação da contraparte, em contrariedade ao disposto no art. 38, I, da mesma Resolução.
Irresignada, recorreu a prestadora.
No que se refere aos pressupostos de admissibilidade recursal, restam presentes todos os requisitos, quais sejam: tempestividade, cabimento, interesse e legitimidade para recorrer, inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer, e regularidade formal.
Quanto ao mérito, a recorrente sustenta que apesar de não ter ocorrido a observância ao disposto no artigo 38, da resolução TSE nº 23.607/2019, pagamento com cheque cruzado, é perfeitamente possível a identificação do pagamento realizado, tanto do contratante, quanto do contratado, constando inclusive informações quanto CPF e CNPJ, no documento juntado no ID 100042866, “contrato de prestação de serviços na Campanha eleitoral”. Em razão disso, pugna pelo provimento do recurso para reformar a sentença e aprovar as contas, ainda que com ressalvas, afastando-se o dever de recolhimento de valores à União.
Assiste parcial razão à recorrente.
O exame técnico apontou que parte dos gastos financeiros realizados pela candidata não observou os critérios do art. 38 da Resolução nº 23.607/2019, conforme se depreende do extrato bancário de sua conta FEFC (ID 44973190). Intimada, a candidata prestou esclarecimentos no sentido de que é perfeitamente possível a identificação do pagamento realizado, tanto do contratante, quanto do contratado, constando inclusive informações quanto CPF e CNPJ, no documento juntado no ID 100042866, “contrato de prestação de serviços na Campanha eleitoral”.
A justificativa não foi admitida e o Parecer Conclusivo (ID 44973195) manteve o apontamento da irregularidade em relação aos gastos com recursos do FEFC no valor de R$ 500,00, relativos a um pagamento efetuado por meio de cheque sem a devida identificação da contraparte.
De fato, a argumentação apresentada pela recorrente não é apta a afastar a irregularidade.
O pagamento com cheque no valor de R$ 500,00 não está amparado em adequada comprovação da despesa realizada com recursos públicos, porquanto o título não foi emitido na forma nominativa e cruzada, em descumprimento ao que determina o art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019, não havendo elementos para identificar o respectivo beneficiário. A mera juntada de documentos produzidos pela candidata ou pelo suposto prestador de serviços (ID 44973171) não supre a exigência estabelecida pela norma citada.
Cumpre ressaltar que os meios de pagamento previstos no art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos e, por consequência, da veracidade do gasto correspondente.
Tais dados fecham o círculo da análise das despesas, mediante a utilização de informações disponibilizadas por terceiro alheio à relação entre credor e devedor e, portanto, dotado da necessária isenção e confiabilidade para atestar os exatos origem e destino dos valores. Isso porque somente o registro correto e fidedigno das informações pela instituição financeira permite o posterior rastreamento, para que se possa apontar, por análise de sistema a sistema, eventuais inconformidades.
Assim, se por um lado o pagamento pelos meios indicados pelo art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/19 não é suficiente, por si só, para atestar a realidade do gasto de campanha informado, ou seja, de que o valor foi efetivamente empregado em um serviço ou produto para a campanha eleitoral, sendo, pois, necessário trazer uma confirmação, chancelada pelo terceiro com quem o candidato contratou, acerca dos elementos da relação existente; por outra via a tão só confirmação do terceiro por recibo, contrato ou nota fiscal também é insuficiente, pois não há registro rastreável de que foi tal pessoa quem efetivamente recebeu o referido valor.
É somente a triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes, que permite, nos termos da Resolução TSE nº 23.607/2019, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se trata de aplicação de recursos públicos.
Ademais, a obrigação de que os recursos públicos recebidos pelos candidatos sejam gastos mediante forma de pagamento que permite a rastreabilidade do numerário até a conta do destinatário (crédito em conta), como se dá com o cheque cruzado (art. 45 da Lei nº 7.357/85), assegura que outros controles públicos possam ser exercidos, como é o caso da Receita Federal e do COAF.
Finalmente, ao não ser cruzado o cheque, permitindo o saque sem depósito em conta, resta prejudicado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e gastos de campanha, uma vez que impossibilitada a alimentação do sistema Divulgacandcontas com a informação sobre o beneficiário, inviabilizando o controle por parte da sociedade.
A realização de gastos com recursos do FEFC e do FP mediante a utilização de forma de pagamento vedada importa em utilização indevida de recursos públicos, ensejando o recolhimento ao Tesouro Nacional nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE 23.607/2019.
Portanto, não há como afastar a irregularidade referente ao pagamento realizado pela prestadora, no montante de R$ 500,00, uma vez que o cheque emitido não foi cruzado e não há como confirmar se o valor em questão efetivamente beneficiou o prestador de serviços informado no SPCE, inviabilizando-se a certificação da regularidade da despesa eleitoral.
Por outro lado, embora se trate de malversação de recursos públicos, mas considerando que o valor absoluto da falha está bem abaixo do patamar de R$ 1.064,10, utilizado por esse e. Tribunal para aplicação do princípio da proporcionalidade, tem-se que é possível, no caso, a aprovação das contas com ressalvas, sem prejuízo da obrigatoriedade de devolução do montante irregular ao Tesouro Nacional.
Ante o exposto, o Ministério Público Eleitoral opina pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas da recorrente, mantendo-se a determinação de recolhimento de R$ 500,00 ao Tesouro Nacional.
Porto Alegre, 24 de fevereiro de 2023.
José Osmar Pumes,
Procurador Regional Eleitoral.