PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS (12046) Nº 0600295-74.2020.6.21.0072 / 0072ª ZONA ELEITORAL DE VIAMÃO/RS
REQUERENTE: ELEICAO 2020 ANTONIA NELES PRESTES ROCHA VEREADOR
Eminente Relator(a),
para conferir maior celeridade na tramitação das prestações de contas das eleições de 2020, os pareceres desta Procuradoria estão sendo encaminhados em formato simplificado, como segue.
Trata-se de prestação de contas da candidata a vereadora ANTONIA NELES PRESTES ROCHA, relativamente às eleições de 2020, no município de VIAMÃO/RS.
A sentença desaprovou as contas, com base no art. 74, III, da Resolução TSE nº 23.607/19, e determinou o recolhimento do valor de R$ 600,00 ao Tesouro Nacional, relativo a pagamento efetuado com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) sem a devida identificação da contraparte, em contrariedade ao disposto no art. 38, I, da mesma Resolução.
Irresignada, recorreu a prestadora.
No que se refere aos pressupostos de admissibilidade recursal, restam presentes todos os requisitos, quais sejam: tempestividade, cabimento, interesse e legitimidade para recorrer, inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer, e regularidade formal.
Em suas razões de irresignação, a recorrente sustenta, preliminarmente, a nulidade da decisão que rejeitou os embargos declaratórios opostos à sentença, por ausência de adequada fundamentação. Quanto ao mérito, afirma que o destinatário do pagamento foi corretamente identificado no SPCE, tendo sido juntada aos autos a documentação comprobatória, consistente em contratos, recibo e extrato bancário. Acrescenta que “o CPF do destinatário consta expressamente descrito nos contratos, nos recibos e no relatório de despesa”. Reputando comprovada a regularidade da despesa questionada, pugna pelo provimento do recurso para aprovar as contas ainda que com ressalvas.
Assiste parcial razão à recorrente.
Inicialmente, não há razão para acolhimento da preliminar de nulidade, uma vez que a decisão que apreciou os embargos, embora sintética, reportou-se à sentença, que efetivamente examinou a matéria impugnada, como se depreende do seguinte trecho:
1) Após a manifestação da candidata restaram ainda gastos eleitorais com recursos do FEFEC no total de R$ 600, que descumpriram a previsão do Art. 38 da Resolução TSE 23.607/19, qual seja, a comprovação do CPF do destinatário na movimentação bancária.
Em sua manifestação a candidata alega que “informou” tais dados no sistema SPCE, caso em que não supre a exigência de “comprovação” destes dados junto aos extratos bancários ou outros comprovantes do CPF/CNPJ do destinatário. Sujeitando-se assim, à desaprovação das contas, bem como à devolução dos valores irregulares ao Tesouro Nacional, conforme previsto no Art. 79, §§ 1º e 2º, da resolução TSE 23.607/2019.
Tratando-se de mera inconformidade em relação ao mérito da sentença, sem que fosse indicada a efetiva omissão, os embargos deveriam de fato ser rejeitados.
De todo modo, devolvendo a esse e. TRE-RS o exame de toda a matéria probatória, o recurso eleitoral interposto permite que as alegações da candidata sejam examinadas em profundidade, suprindo eventual lacuna da decisão do juízo de origem. Ademais, incide na espécie a previsão do art. 1.013, § 3º, IV, do CPC, o qual estabelece que, em caso de eventual nulidade por ausência de fundamentação, o tribunal deve desde logo decidir o mérito se o processo tiver condições de imediato julgamento (teoria da causa madura).
Assim, a preliminar deve ser rejeitada.
Passa-se ao exame do mérito.
O exame técnico apontou que parte dos gastos financeiros realizados pela candidata não observou os critérios do art. 38 da Resolução nº 23.607/2019, conforme se depreende do extrato bancário de sua conta FEFC (ID 45002073), que registra o saque da quantia de R$ 600,00, em 22.10.2020. Intimada, a candidata manifestou-se afirmando que O valor indicado no item 4 serviu ao pagamento de 2 contratos de prestação de serviços. A justificativa não foi admitida e o Parecer Conclusivo da Unidade Técnica (ID 45002438) manteve o apontamento da irregularidade em relação aos gastos com recursos do FEFC no valor de R$ 600,00, relativos ao citado saque.
A argumentação apresentada pela recorrente não é apta a justificar os pagamentos realizados.
Os documentos apresentados (ID 45002436) no intuito de comprovar que o saque no valor de R$ 600,00 destinou-se ao pagamento de despesas eleitorais não são suficientes para atestar a regularidade dos gastos realizados com recursos públicos, que não observaram as formas expressamente previstas no art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019, não havendo elementos para identificar o respectivo beneficiário.
Cumpre ressaltar que os meios de pagamento previstos no art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos e, por consequência, da veracidade do gasto correspondente.
Tais dados fecham o círculo da análise das despesas, mediante a utilização de informações disponibilizadas por terceiro alheio à relação entre credor e devedor e, portanto, dotado da necessária isenção e confiabilidade para atestar os exatos origem e destino dos valores. Isso porque somente o registro correto e fidedigno das informações pela instituição financeira permite o posterior rastreamento, para que se possa apontar, por posterior análise de sistema a sistema, eventuais inconformidades.
Assim, se por um lado o pagamento pelos meios indicados pelo art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/19 não é suficiente, por si só, para atestar a realidade do gasto de campanha informado, ou seja, de que o valor foi efetivamente empregado em um serviço ou produto para a campanha eleitoral, sendo, pois, necessário trazer uma confirmação, chancelada pelo terceiro com quem o candidato contratou, acerca dos elementos da relação existente; por outra via a tão só confirmação do terceiro por recibo, contrato ou nota fiscal também é insuficiente, pois não há registro rastreável de que foi tal pessoa quem efetivamente recebeu o referido valor.
É somente a triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes, que permite, nos termos da Resolução TSE nº 23.607/2019, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se trata de aplicação de recursos públicos.
Ademais, a obrigação de que os recursos públicos recebidos pelos candidatos sejam gastos mediante forma de pagamento que permite a rastreabilidade do numerário até a conta do destinatário (crédito em conta) assegura que outros controles públicos possam ser exercidos, como é o caso da Receita Federal e do COAF.
Finalmente, ao ser realizado o saque do numerário em espécie pela candidata, resta prejudicado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e gastos de campanha, uma vez que impossibilitada a alimentação do sistema Divulgacandcontas com a informação sobre o beneficiário, inviabilizando o controle por parte da sociedade.
A realização de gastos com recursos do FEFC mediante a utilização de forma de pagamento vedada importa em utilização indevida de recursos públicos, ensejando o recolhimento ao Tesouro Nacional nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE 23.607/2019.
Portanto, deve ser mantida a conclusão pela irregularidade da despesa, que totaliza R$ 600,00, uma vez que, realizado o saque em espécie, não há como verificar se o valor sacado beneficiou o prestador dos serviços apontados na prestação de contas, inviabilizando-se a certificação da regularidade da despesa eleitoral.
Por outro lado, embora se trate de malversação de recursos públicos, mas considerando que o valor absoluto da falha está abaixo do patamar de R$ 1.064,10, utilizado por esse e. Tribunal para aplicação do princípio da proporcionalidade, tem-se que é possível, no caso, a aprovação das contas com ressalvas, sem prejuízo da obrigatoriedade de devolução do montante irregular ao Tesouro Nacional.
Ante o exposto, o Ministério Público Eleitoral opina pelo provimento parcial do recurso, para aprovar as contas com ressalvas, mantendo-se a determinação de recolhimento do valor de R$ 600,00 ao Tesouro Nacional.
Porto Alegre, 26 de fevereiro de 2023.
José Osmar Pumes,
Procurador Regional Eleitoral.